quinta-feira, março 05, 2009

Os escondidos


Gosto de pessoas com opinião, gosto de pessoas frontais, mesmo que discorde delas. Uma pessoa que tem uma visão do mundo diferente da minha é alguém com quem consigo falar, discutir, confrontar ideias. Posso ter problemas com quem discordo, mas o pior são os outros. Os escondidos. Os que pensam mas não dizem, os que fogem, os politicamente correctos.
António Pinto Leite escreveu uma crónica no Expresso deste sábado em que se compadece com o sofrimento e descriminação dos homossexuais. Sente até que limitar as suas uniões às uniões de facto é insuficiente. Passa dois terços do artigo a defender as dores da comunidade gay, sincero e condoído.
Até que chega ao ponto que na realidade queria abordar, o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. Ele até acha que as relações homossexuais "são idênticas na união de afectos humanos, na partilha de intimidade, no propósito de comunhão de vida."
Mas daí a merecerem ser um casamento vai um passo de gigante. Até porque "são decisivamente diferentes no projecto de família que encerram, no enquadramento para o desenvolvimento da personalidade das crianças, na tendência natural geradora de vida e na própria diferença entre sexos, diferença que, em si mesma, faz toda a diferença."
Não percebo. Devo ser estúpido.
Afinal existe um projecto de família comum entre todos os casais heterossexuais? A sério? Um casal da Opus Dei tem o mesmo projecto de vida que uma prostituta casada com um marinheiro?
Existe um enquadramento para o desenvolvimento da personalidade das crianças comuns aos casais homossexuais? Uma vez mais...
E existe uma tendência natural geradora de vida? Mesmo em casais estéreis? Ou casais que não querem ter filhos? Devem eles ser proibidos de casar? E quem disse que um casal homossexual não tem uma tendência geradora de vida? Não existem inseminações artificiais, barrigas de aluguer ou vá, a adopção?
Mas uma vez mais, eu sou estúpido, não percebo muita coisa, daí colocar tantas questões.
Sobra um único motivo plausível, o único aliás que importa, a diferença de sexos em si. Bem espremido é tudo o que incomoda António Pinto Leite, duas pessoas do mesmo sexo não podem casar porque são duas pessoas do mesmo sexo. Ele até nem se importa que lhe chamem outra coisa, união civil por exemplo. Mas casamento é que não.
Isso é a base, a génese da discriminação, alguém não pode fazer algo apenas por ser quem é. Um casal homossexual não pode casar por ser um casal homossexual, uma mulher não pode votar por ser mulher, um negro não pode ser livre por ser negro.
Ao menos que tivesse coragem para se afirmar como homofóbico, ao menos tivesse coragem para assumir as suas posições e o seu preconceito.
São estes os piores, os escondidos. Porque um nazi com a suástica no peito é alguém que sei o que pensa e o que quer do mundo. Alguém com quem posso lidar, defender-me, argumentar.
Agora os outros, esses sim, são perigosos.