quarta-feira, janeiro 31, 2007

Às quartas... porque sim!


Comecei esta rubrica a semana passada, na qual viso explicar os motivos que me levam a votar Sim no referendo de dia 11. O primeiro foi Saúde Pública, o segundo é a Lei Actual.
Há uma coisa que toda a gente sabe mas que parece ser esquecido nos discursos, o que está em referendo é tão simplesmente isto – as mulheres que resolvem interromper a gravidez até às dez semanas devem ser presas? Está-se a falar de despenalizar, não é apoiar, liberalizar, globalizar, normalizar, obrigar, ou seja o que for, a única, repito ÚNICA questão aqui é saber se as mulheres que tomam esta difícil decisão devem depois ver ou não a sua vida devassada, escrutinada, serem acusadas e sujeitas a uma pena de prisão.
Muitos dos defensores do Não afirmam que esta é uma falsa questão, que nenhuma mulher é realmente presa e que portanto não se deve alterar a lei. Para mim isto indica o oposto, se as mulheres não são presas é porque os juízes, a sociedade em geral sente alguma repulsa em o fazer, não cumprindo a lei. Ora a Lei não é algo que exista por si só, a Lei é a emanação daquilo que uma certa sociedade considera certo ou errado, e uma lei que não é posta em prática é por definição uma lei errada. É no entanto uma lei que empurra as mulheres para o sub-mundo do aborto ilegal, que as torna arguidas e as persegue, mesmo que no fim ninguém as queira prender. Até ao dia... até ao dia em que um juiz mais conservador se agarre à letra da lei e não atenda às súplicas de quem já sofreu tanto.
Outro ponto interessante é a análise da lei actual. A lei permite o aborto em três casos: perigo de vida da mãe, violação da mãe e malformação do feto. O primeiro caso é bastante óbvio, é preservar a vida da mãe, ok. No entanto já o segundo e o terceiro caso me levam a reflectir. Quais os motivos para impedir uma gravidez que resulte de uma violação? Suponho que seja não obrigar a mulher a passar por uma gravidez que começou com um caso traumático e ter um filho indesejado. E malformação do feto? Nem precisa ser uma malformação demasiado grave, se houver hipótese da criança nascer cega ou surda o aborto é permitido. Porquê? Suponho que seja para não obrigar a mãe a ter uma criança que lhe vai causar sérios problemas ao longo da vida e que pode ela própria (em caso de atrasos mentais profundos) não chegar a gozar de uma vida plena. São dois casos que existem para evitar causar dor, sofrimento, desgaste aos pais, para preservar a vida dos pais e das suas famílias. E ninguém contesta esta lei, ninguém acha que uma violada deve ter o filho, apesar de o poder dar para adopção, como parece ser a solução milagrosa preconizada por muitos defensores do Não. Mas se se considera que estes casos de gravidez indesejada podem ser alvo de aborto, porque não outros? Porque não alguém que não tem dinheiro para sustentar o filho, ou que tem 16 anos e vê a sua vida parar, ou que é demasiado velho e doente, ou que viu o homem da sua vida abandoná-la por alguém mais novo, ou os mil e um motivos que nem me passam pela cabeça porque não vivo as vidas das mulheres que têm que tomar das decisões mais complicadas que alguma vez tomaram? Quem somos nós para dizer que um filho deficiente é mais problemático ou menos desejado que outro? Quem somos nós para decidir pela mulher? A lei já diz que a mulher pode decidir, mas a lei não engloba todas as situações, não pode englobar porque não consegue. Só quem vive é que tem capacidade de decidir sobre a sua vida? Quem somos nós para dizer o contrário?

terça-feira, janeiro 30, 2007

Stranger Than Fiction


Marc Foster tomou o mundo da Sétima Arte de assalto em 2001 com a sua segunda longa-metragem Monster's Ball, um filme negro e deprimente, mas ao mesmo tempo tocante, que valeu um Oscar a Halle Berry. Manteve a sua boa estrela com o terno Finding Neverland e provou a sua versatilidade com o thriller Stay. Agora tem um novo projecto, uma comédia intitulada Stranger Than Fiction.
Um homem, fiscal do IRS, solitário, enfadonho e obcecado por números, que começa a ouvir uma voz que lhe narra a vida. Descobre que é o personagem de uma história e que a sua autora o está prestes a matar.
Stranger Than Fiction tem uma permissa inovadora e muito interessante, e é um filme antes de mais muito inteligente no uso que faz dela. A forma como somos levados para este mundo, para esta vida fechada sobre si mesma e vemos, em paralelo, o desepero do personagem e do seu criador, é de louvar. Emma Thompson está brilhante, Maggie Gyllenhaal tem um magnetismo próprio e até Will Ferrel se insere num registo uns passos mais acima do seu normal.
Bem escrito, imprevisivel, curioso em algumas soluções encontradas (como os números que aparecem desde o início na imagem), Stranger Than Fiction é o confirmar de um um autor que ainda tem muito para dar.

Música da Semana

Honestamente já me apetecia um pouco de música lusa aqui no blog, mas o regresso à lingua de Camões ainda vai ter que esperar, o file lodge continua em baixo e não encontro outro site onde possa alojar as músicas para fazer o stream para aqui, sugestões são bem-vindas.
Até lá fica o melhor que encontro na net, nesta semana Portishead, banda alternativa inglesa, com uma sonoridade melancólica, e com Beth Gibbons na voz - rouca, depressiva, itensa, memorável. Do primeiro album de 1994 Dummy aqui fica o fabuloso Glory Box...

segunda-feira, janeiro 29, 2007

Por Detrás dos Montes

No dia 22 de Dezembro do ano passado recebi um telefonema de uma amiga a dizer-me que eu tinha que ir ver a peça "Por Detrás dos Montes" que estava no Meridional e que ia sair no dia seguinte. Não consegui arranjar tempo. No entanto a peça voltou a cena e no sábado passado consegui finalmente vê-la. É excepcional.
Por Detrás dos Montes é a segunda peça do Projecto Províncias, que visa criar espectáculos que captem a singularidade das diferentes regiões de Portugal. Esta fala, como o título sugere, de Trás-os-Montes, e se como me disse uma amiga, o teatro serve antes de mais para me contar uma história, esta peça não o faz, conta mil. Estão lá todos, os emigrantes, os miúdos, os velhos, os pauliteiros e os agricultores, as bordadeiras, as professoras, as dores, os mitos, os costumes, a religião, os amores, os cheiros, as cores, os sons, um mundo transmontano quase mítico. E pouco interessa se ele existe tal qual, se as Floribelas não inundaram já as mentes e hábitos daquela gente, se é real, ou quase efabulado, mas é um retrato profundo, intenso, humano, místico e tocante, muito tocante, capaz de levar às lágrimas. Toda a peça – e será peça? não roça aqui o limite da dança? da música? - que não conta com palavras como meio de comunicação, está imbuída de um espírito quase mágico, que apenas se consegue com talento, dedicação, e trabalho, muito trabalho, estudo, pesquisa - foram cinco as residências artísticas - e empenho. Visualmente poderoso, marcante, com soluções cénicas simples, mas nunca simplistas ou simplórias, sempre inesperadas, sempre emblemáticas. Tem na música um dos seus elementos mais importantes e um imenso Fernando Mota, que concebeu inclusive a máquina musical que domina a sonoridade do espectáculo.
Imperdivel, absolutamente imperdível, dá vontade de ver e rever, saborear intensamente, até que o dia se desvaneça à nossa volta.

Por Detrás dos Montes


Teatro Meridional


Concepção e Direcção Cénica Miguel Seabra

Dramaturgia e Assistência Artística Natália Luíza

Interpretação: Carla Galvão, Carla Maciel, Fernando Mota, Mónica Garnel, Pedro Gil, Pedro Martinez, Romeu Costa
Espaço Cénico e Figurinos Marta Carreiras

Música Fernando Mota

Marionetas Eric da Costa

Até 17 de Fevereiro de 2007

Quarta, Quinta e Sexta - 22h, Sábado - 17h e 22h

Preço: 12€ (existem diversos descontos, perguntar na bilheteira)


Teatro Meridional
Rua do Açucar, 64
1950-009 Lisboa
Telefone: 218 689 245
Fax: 218 689 247
www.teatromeridional.net
teatromeridional@teatromeridional
.net

sexta-feira, janeiro 26, 2007

passado mas não esquecido

Às vezes há coisas que passam por mim e que não são registadas aqui no blog, seja lá por que motivo for. Mas é bom ter momentos em que se pode parar e prestar a devida homenagem. No teatro Camões esteve em Novembro do ano passado o ciclo Como Tu e Eu, em que diversos coreógrafos preparavam espectáculos com pessoas sem formação em dança. Foram diversas propostas interessantes, das quais só tive oportunidade de ver uma, o Natural de Clara Andermatt, espectáculo preparado para a Company of Elders, um grupo inglês de idosos. Foi dos espectáculos mais tocantes e profundos que já vi, num misto de teatro, música e dança, a segunda coisa que vejo desta senhora (a seguir ao Grito do Peixe) e a segunda genial. A forma como ela utiliza os corpos, as vozes, as vidas, os sonhos e medos daqueles homens e mulheres é incrível. Um final arrepiante, onde os performers contemplam a sua própria mortalidade, que foi de levar às lágrimas.

Um outro espectáculo – esse ainda em cena – é O Auto da Barca do Inferno que está nos claustros do Mosteiro dos Jerónimos. É um espectáculo disponível apenas por marcação e pensado para escolas (como as horas de exibição o mostra), mas que consegue cativar os miúdos desde o primeiro minuto com um texto que nem sempre é fácil. Os claustros são uma escolha primorosa e as soluções de encenação (com escadotes a ter os mais variados usos) dão uma vida à peça que é de assinalar. Está até Março com novo elenco, saiu Graciano Dias e João Barbosa (absolutamente hilariante) para o espectáculo Moby Dick em cena no S. Luiz, e entraram para o seu lugar Mário Sousa e Filipe Vargas que eu não tive oportunidade de ver. Se Duarte Gomes é um anjo fraquinho e Francisco Nascimento tem mais cara que voz, o resto do elenco tem o talento e a energia suficiente para cativar os espectadores. Para quem estuda e não só, até Abril em Belém.


O Auto da Barca do Inferno

Ar de Filmes
Interpretação: Graciano Dias, Henrique Malta, Duarte Gomes, Francisco Nascimento, Solange Santos e João Barbosa
Encenação: António Pires
Texto: Gil Vicente
2 de Novembro de 2006 a Abril de 2007
Terça a Sexta, às 11h e às 14h – Espectáculo sujeito a marcação prévia
Preço bilhetes: 10,00 € (normal); 6€ (escolas)


Mosteiro dos Jerónimos
Praça do Império
1400-206 Lisboa
Telefone: 213 420 810
Fax: : 213 420 810

Para desanuviar...

Alguns tornam-se clássicos instantâneos...

diz lá?

"... pois, eu vou votar Não porque se o Sim ganha o Sócrates fica com mais força!"

quinta-feira, janeiro 25, 2007

Improviso

Quando este blog foi criado chamava-se Sopros D'Improviso, o Improviso saiu do Sopros, mas não da minha vida. Ontem na aula de teatro foi um dos temas centrais. O relaxamento inicial foi invulgarmente longo, durando mais de vinte minutos. A seguir trabalho sensorial físico, um barco, ondas, sensação no corpo de tempestade, não a representação de tempestade, mas a sensação de tempestade, interior, nas pernas, no tronco, no corpo, na cabeça, no enjoo.

A seguir, e durante a maior parte da aula, improviso. O Bruno escolheu quatro alunos. Deu instruções a cada um deles sem que mais ninguem ouvisse quais eram. Deu-lhes um objectivo a cumprir nessa improvisação. Em seguida foram entrando um por um outros alunos, cada um com o seu objectivo específico. A confusão instalou-se com resultados mais ou menos cómicos. O exercício repetiu-se três vezes com três grupos de alunos diferentes. O que parecia ser uma balbúrdia informe serviu para nos ensinar três coisas:


  1. é fácil perdermos noção dos colegas, temos que estar atentos a quem nos rodeia, sem isso não existe contracenação apenas monólogo;
  2. é fácil perdermos o nosso objectivo como personagem, isso é o mais importante, sabermos quem somos em cena e porque é que ali estamos, manter o foco;
  3. em comédia não vale a pena sublinhar o óbvio, o humor existe se nos mantivermos atentos aquilo que estamos a fazer, o resto é ruído e excesso que perturba o aquilo que queremos transmitir.

No fim em círculo, tivemos que olhar uns para os outros até nos fixarmos numa pessoa, mesmo que ela não estivesse a olhar para nós. Em seguida, ao som de uma música, imaginar um local, uma situação e uma cena. Colocar essa pessoa como personagem nessa cena e construir uma pequena história, de olhos fechados, durante o relaxamento final. Essa história escrita vai ser usada quarta-feira que vem. Estou curioso quanto ao resultado.

quarta-feira, janeiro 24, 2007

Às quartas... porque sim!


O referendo sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez até às dez semanas a pedido da mulher é no próximo domingo dia 11 de Fevereiro. Quarta-feira passada fiz um post em que falava da importância deste referendo e da obrigação moral que cada um de nós tem em ir expressar a sua opinião. A partir de hoje, todas as quartas feiras, vou expor um motivo pelo qual vou votar SIM nesse referendo nacional.
São três os motivos pelos quais vou votar SIM. Hoje apresento o primeiro:

SÁUDE PÚBLICA: O aborto ilegal é um problema global de saúde pública. Por ano cerca de 10.000 mulheres entram nos hospitais com problemas resultantes de abortos ilegais, feitos nas circunstâncias mais sub-humanas que se pode imaginar. Os danos são muitas vezes permanentes, impossibilitando a mulher de voltar a engravidar (o que no caso dos adolescentes é algo particularmente grave) e até levar à morte.

A ilegalidade e a perspectiva de aborto clandestino leva a que a decisão sobre abortar seja muitas vezes adiada, levando a que sejam feitos em fases mais avançadas da gravidez, tornando-os mais penosos e arriscados.

Existe toda uma indústria ilegal que sobrevive destes abortos, cobrando preços exorbitantes. Quem os não pode pagar, nem ir ao estrangeiro, acaba por tentar fazer abortos caseiros, ainda mais perigosos, com químicos, mezinhas ou pura e simplesmente força bruta, tesouras, agulhas, quedas forçadas, todo o tipo de atrocidades feitas a si mesma no meio do desespero.
Em termos psicológicos, as sequelas de um aborto podem ser graves, sem dúvida, mas são imensamente agravadas pela forma como o aborto é efectuado. Sem acompanhamento médico, em sítios que descem muitas vezes abaixo dos níveis mínimos da dignidade humana, a mulher está sozinha e completamente desamparada.
Se o SIM ganhar os abortos passarão a ser efectuados em hospitais e clínicas públicas, com todo o apoio médico necessário, o que significa que terão consultas de genecologia, garantindo a segurança e saúde da paciente. Se o planeamento familiar e a divulgação são fundamentais, não é com o aborto clandestino que são conseguidas. É através do apoio nos locais certos às pessoas que se encontram na posição de querer abortar, é fazendo consultas com as mulheres que decidam ir para a frente, de forma a poder chegar até elas, sem censuras nem recriminações, e educá-las na sua sexualidade e nos métodos contraceptivos disponíveis, para que não sejam casos recorrentes.
Em todos os países europeus em que a despenalização existe, o número de abortos legais cresceu exponencialmente no ano da sua legalização, para depois decrescer gradualmente de ano para ano, mostrando que é levando as mulheres aos centros médicos e clínicos que se faz a educação e prevenção nos grupos de risco.
Olhando mesmo para os argumentos economicistas do NÃO, que diz não querer financiar as clínicas de aborto com os impostos, porque não dizer que os custos de tratar as mulheres que precisam ser tratadas depois dos abortos ilegais é enorme?
O NÃO está no poder desde sempre e o problema persiste, já se provou que não funciona a nenhum nível. Está na altura de mudar e votar SIM.

Oscar oscar....

E lá veio a lista dos nomeados para os prémios da Academia, cuja cerimónia se realiza no dia 25 de Fevereiro, Domingo como de costume, infelizmente para aqueles que, como eu, sofrem para se manter acordado madrugada fora.
E o que é que se viu... Mais ou menos o esperado. Um dos grandes perdedores logo à partida foi Dreamgirls, vencedor do Globo de Ouro de Melhor Filme Musical/Comédia e que nem nomeado para o Óscar de Melhor Filme foi, United 93, teve a nomeação para Melhor Realização, mas não Melhor Filme, uma distinção que parece premiar mais o tema do filme, do que os seus méritos. Babbel, tal como nos Globos de Ouro, foi o filme com mais nomeações, sete no total, mas este, tudo indica, será o ano de Scorsese. The Departed com 5 nomeações, deve ser o vencedor na categoria de Melhor Filme, ou pelo menos Melhor Realizador, prémio há muito merecido. Eastowood, carrasco de Scorsese em edições anteriores, conseguiu 4 nomeações com Letters From Iwo Jima, mas tendo já adquirido diversas estatuetas com Million Dollar Baby e Unforgiven (para além das nomeações para Mystic River), não parece provável que volte a vencer este ano.
No capitulo da representação os prémios principais parecem já estar atribuidos. Forrest Whitaker com The Last King of Scotland, um filme sobre Idi Amin, cruel ditador do Uganda, tem a estatueta practicamente assegurada. Ao lado de um rei uma rainha, Helen Mirren, com The Queen, no seu papel como rainha Isabel II, é também uma vencedora antecipada, apesar do fabuloso papel de Meryl Streep em The Devil Wears Prada, que lhe valeu a sua décima quarta nomeação, tendo vencido por duas vezes. Little Miss Sunshine é o outsider cujas nomeações, quatro no total, premeiam não só o filme, mas a nova vaga de cinema independente americano e Pan’s Labyrinth (El Labirinto del Fauno), novo filme de Guillermo del Toro, a história poderosa de uma menina que vive num mundo imaginado durante a Espanha de Franco, é a grande surpresa (6 nomeações) e parece ser o maior candidato ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro. Podem ver a lista completa de nomeados aqui.
Um grande número de filmes nomeados ainda não estrearam em Portugal, portanto estejam atentos nas próximas semanas a:

  • Blood Diamond
  • Dreamgirls
  • The Good German
  • The Good Sheperd
  • Half Nelson
  • The Last King of Scotland
  • Letters From Iwo Jima
  • Little Children
  • Notes on a Scandal
  • Pan's Labyrinth
  • The Persuit of Happyness
  • Venus

Para lém destes vale a pena ter atenção a filmes não nomeados como o recém estreado Scoop, ou The Wicker Man e Stranger Than Fiction.Muito e bom cinema. Dia 25 de fevereiro o tira teimas final

And so it is...

Aperto de mão, sorrisos, acordo final, só falta assinar por baixo...

E rumo a novas paragens, uma nova vida no aniversário de um outro passo dado...

Maio...

terça-feira, janeiro 23, 2007

Brilhante!


Ontem o Bruno regressou às aulas, que é como quem diz, ontem voltámos a ter aulas de teatro. Antes de mais um anúncio, no início de Junho (ainda não tenho data certa), vou subir a palco pela primeira vez com a peça anual do curso. A ver vamos como sai.
A aula começou com um aquecimento ao som de música, o Bruno quer analisar a nossa resposta física ao estímulo musical, não propriamente dança, mas a plasticidade do corpo ao som da música, seguindo-a ou libertando-se do ritmo imposto. O som foi portanto, e como de costume, uma constante. Trabalho com o sol, sensorial, físico, instalar uma sensação de bem-estar, perceber como o sol se manifesta no corpo, o molda e altera. Em seguida colocar no espaço alguém que tenhamos desiludido, trabalhar com ela, e por fim transferir essa pessoa para um colega, trabalhar com ele como se fosse outro.
Intervalo...
Aqui a aula ganha uma outra dimensão. Um poema (olhos, boca, sangue...)que serve de mote (sangue que mata...) ao exercício seguinte (lua...), texto, música, expressão física profunda e um limite, uma barreira invisível transposta, o corpo, o nosso corpo, o corpo dos outros, o libertar de sensações e pulsões que não são tratadas no dia-a-dia, calor, erotismo, morte, sem medos, uma explosão de emoções, sozinhos, com outros, por momentos não éramos nós, por momentos não estávamos ali, homem, mulher, animal, a linha tornou-se ténue, do apocalíptico ao etéreo, passámos por diversos estados, mas sempre, sempre em contacto com algo... primário e sempre a desafiar os limites.
Foi um romper importante, cheguei eléctrico a casa, ainda contagiado por toda aquele energia, foi uma das melhores aulas que alguma vez tive...

Musica da Semana

Então e Leonard Cohen? Sem grandes apresentações, cantor, escritor, poeta, um dos grandes nomes do panorama musical dos anos 70 e 80, nem sempre amado, nem sempre brilhante, mas sempre único, com a sua voz profunda, quase falado, como se fugisse das melodias, como se brincasse com as melodias, como se fosse um poema em movimento...
Para esta semana, uma das suas obras mais emblemáticas... Suzanne...

segunda-feira, janeiro 22, 2007

Breaking and Entering

Anthony Minghella, realizador de O Paciente Inglês e Cold Mountain, voltou à cadeira de realizador com este projecto, que ele próprio escreveu, Breaking and Entering (Assalto e Intromissão). É um filme sobre o afastamento, sobre o isolamento que se cria, a distância que existe entre nós e a pessoa que está ao nosso lado. Jude Law é um arquitecto com um projecto ambicioso e um atelier novo numa zona pobre de Londres. A sua carreira vai de vento em popa, mas a sua relação com a namorada (Robin Whright Penn) está com problemas, principalmente por causa da filha autista. O atelier é recorrentemente assaltado pelo filho de uma emigrante bósnia (Juliette Binoche) que luta para sobreviver acumulando diversos empregos e educando sozinha o rapaz, depois do pai ter sido morto na guerra.
A procura de paz, amor, afecto, ternura, é o tema que sublinha todo o filme, mas que é apenas atingido através de rupturas, de crises, é preciso forçar para tocar o outro, e é aqui que o título do filme ganha um segundo sentido: assalto e intromissão como designação jurídica dos assaltos que põem a história em movimento, mas tambem como metáfora das barreiras de vidro que colocamos à nossa volta e que são apenas destruidas quando alguém força a entrada.
É, como habitual em Minghella, uma história bem contada, com momentos dramáticos e emotivos. No entanto está longe de ser perfeito, principalmente por alguns buracos no argumento (a cena final de tribunal não faz sentido), alguma pressa no desenvolvimento das relações e personagens subaproveitadas (Vera Farmiga por exemplo, que faz de uma prostituta sui-generis, a qual acaba por desaparecer sem nada acrescentar à história).
É mais um drama urbano, a fazer lembrar Closer que, sem atingir o nível deste último, merece mesmo assim uma visita, nem que seja para ver bons actores numa história que é, a espaços, comovente.

sexta-feira, janeiro 19, 2007

Casting

Quarta-feira passada acabou o workshop com Sofia Gonçalves, que substituiu o Schiappa durante duas semanas, e que visava preparar-nos para um casting. O culminar foi uma simulação de um casting verdadeiro, onde o texto apresentado foi escolha nossa. Por falta de tempo e até de conhecimento, voltei a usar um texto da peça Sax que já tinha utilizado no workshop que fiz com o Thiago Justino.
Tinha faltado à aula de segunda, não por escolha mas porque não me despachei a horas do trabalho, e portanto tive que preparar o texto completamente sozinho. Esta aula não tinha consequências, o casting era apenas uma simulação e caso fosse um fracasso absoluto as aulas continuariam na segunda-feira, como se nada acontecesse. Não havia motivo portanto para estar nervoso, mas a verdade é que estava. Li o texto, decorei-o, trabalhei o meu personagem, fiz o trabalho sensorial, preparei-me, escolhi o guarda-roupa, fui rua a cima a murmurar o meu texto "in character", cheguei lá tenso, mas rapidamente voltei ao que sempre fui, brincalhão, descontraído. Quando chegou a minha vez entrei, disse o nome e idade, sorri de frente e de perfil, mostrei as mãos, acabei de me vestir e comecei... Correu bem. Correu muito bem. Ficou tudo gravado. O meu problema é não ter termos de comparação. Eu sinto que correu bem mas... será que correu? Sem ter passado no palco, televisão ou cinema não tenho como comparar. Estou ansioso para ver o filme e saber se afinal sempre tenho ou não jeito para isto...

FYI


Nova peça com o meu professor Bruno Schiappa. Desta vez no D. Maria II. Segue em baixo a informação.

"Rhona era uma criança de apenas dez anos quando desapareceu da casa dos pais. Encarregue pela mãe de ir visitar a avó, nunca chegaria ao seu destino…
Nancy, a mãe, espera durante 20 anos que a filha regresse, sempre esperançada de que ela está viva. Até ao dia em que a polícia apanha um pedófilo a tentar raptar mais uma criança.
Nancy tem de confrontar-se com a dura realidade: Rhona morreu e é preciso agora cuidar da família que lhe resta. Um marido que já não aguenta mais, uma outra filha que ela negligencia.
Agnetha é uma especialista na mente de assassinos em série, que está a estudar o caso de Ralph. Tenta entrar-lhe dentro da cabeça, perceber o que está por detrás de comportamentos como o dele. Nancy vem procurá-la e pede-lhe uma entrevista com Ralph. Precisa, ela também, de compreender, para poder esquecer. Precisa, talvez, de perdoar ao homem que lhe roubou a vida, porque só assim conseguirá andar para a frente."


Frozen - Presos no Gelo
Teatro Nacional D.Maria II
Interpretação: Lídia Franco, Suzana Borges, Bruno Schiappa
Encenação: Marcia Haufrechtt
Texto: Bryony Lavery
17 de Janeiro a 4 de Março
Terça a Sábado ás 21h45, Domingo 16h15
Preço bilhetes: 10,00 € (existem diversos descontos, perguntar na bilheteira)



Teatro Nacional . Maria II

Praça D. Pedro IV
1100-201 Lisboa
Telefone: 213 250835
reservas@teatro-dmaria.pt

quinta-feira, janeiro 18, 2007

Moby Dick

Moby Dick é um romance de Herman Melville escrito no século XIX, considerado uma das maiores obras americanas. Carregado de metáforas e simbolismos profundos, segue as desventuras da tripulação do navio Pequod e do seu capitão Ahab, na busca insana por uma grande baleia branca, um monstro chamado Moby Dick. Adaptar esta obra ao teatro não é tarefa fácil, mas sob a batuta de António Pires sob hoje a palco a peça Moby Dick no S.Luiz. O resultado não é famoso.
Visualmente a peça é interessante, a máquina de cena é boa, e o trabalho de luz primoroso, a utilização do som é normalmente bem conseguido. Os problemas começam com o elenco, recheado de estrelas sem dúvida, mas com erros de escolha. Se Maria Rueff não começa bem mas também não acaba mal, Miguel Guilherme dá uma interpretação completamente ao lado. É invulgar no caso dele, mas aconteceu. O Capitão Ahab é um personagem mítico, perturbado, obsessivo, maior que a vida, uma alma perdida, irrequieta, gigante, torturada. Nada ali existe, cómico por vezes, mas indiferente, inócuo a maioria, não se sente nada, não há alma, nem drama, nem coisa nenhuma, como se o texto fosse apenas repetido sem qualquer emoção. Existem neste espectáculo duas sessões com linguagem gestual. Ontem a ante-estreia tambem tinha, era curioso reparar na expressividade das tradutoras, que muitas vezes faltava em palco. Miguel Borges é... Miguel Borges. Emotivo, fisicamente expressivo, mas quando começa a falar tudo desaba, torna-se desastrado. Ricardo Aibéu não seria uma escolha óbvia para o primeiro imediato de tal navio, mas aguenta bem o papel, José Airosa é completamente subaproveitado e o resto do elenco não compromete. Graciano Dias desembaraça-se bem como Ismael, João Barbosa e Milton Lopes fazem (o pouco) que lhes é pedido.
A peça arrasta-se ao longo de mais de duas horas, não se percebe, por exemplo, o tempo gasto com Ismael e Queequeg no início do primeiro acto já que, mal embarcam, se misturam com o resto da tripulação não ganhando nenhum relevo especial. Aliás, nada tem um relevo especial. Cenas que deveriam ser pináculos emotivos, como o temperar do arpão de Ahab com o sangue de Queequeg, passam ao de leve num bocejo. Sem chama a peça acaba, com uma baleia gigante que estraga a harmonia cénica sem nada acrescentar. O final trágico não é o da tripulação do Pequod, mas das costas do espectador que já não encontra posição nem lugar.



Moby Dick

Teatro S. Luiz / Ar de Filmes

Interpretação: Maria Rueff, Miguel Guilherme, Ricardo Aibéo, Rui Morisson, Miguel Borges, Graciano Dias, Milton Lopes e João Barbosa
Encenação: António Pires
Texto: Herman Melville
Adaptação: Maria João Cruz
18 de Janeiro a 3 de Março
Quinta e Sexta ás 21h, Sábado às 16h e 21h
Sessões para escolas: Quartas às 11h e 14h30
Sessões com linguagem gestual (sob marcação): 7 de Fevereiro às 11h (escolas) e 10 de Fevereiro 21h (Público geral)
Preço bilhetes: 10,00 € a 20,00 € (normal), 5,00 € (menores 30 anos)

Teatro Municipal S. Luiz

Rua António Maria Cardoso, 38
1200-027 Lisboa
Telefone: 213 257 650
Fax: 213 257 631

quarta-feira, janeiro 17, 2007

A favor ou contra...


No próximo dia 11 de Fevereiro vai existir o segundo referendo sobre a despenalização voluntária da gravidez até às dez semanas. A minha posição sobre o assunto é a mesma de há nove anos e será tratada em futuras postas. Antes de mais, antes da discussão sobre o tema em causa existe um outro ponto fundamental que não pode ser ignorado - há nove anos, num referendo sobre uma matéria tão fundamental como esta, onde a diferença entre as duas partes se limitou a cerca de 48.000 votos, a abstenção foi de 68,11%... Mais de dois terços das pessoas achou ser mais importante ficar em casa, ir almoçar fora ou ir à praia naquele quente domingo de Junho do que ir votar. Foi das demonstrações de maior imaturidade e irresponsabilidade politica, social, humana, que o povo português podia ter dado. E nem as tristes desculpas que se costumam utilizar nas eleições para os orgãos de soberania se podem aqui aplicar. Os habituais desabafos infelizes de "eles são todos iguais", "fica tudo na mesma" são ainda mais vazios aqui, se o Sim ganhar a lei muda, se o Não ganhar fica tudo na mesma. Deste referendo, tal como do anterior, saem consequências directas, palpáveis, que nos definem como sociedade e como país, que nos tocam pessoal e directamente, não só em questões práticas, como a possibilidade de sermos confrontados com a escolha de abortar ou não, mas principalmente em questões dos valores éticos, morais e humanos que nos tocam mais profundamente.
Não ir votar é um acto de não-cidadania, é uma mostra de atraso, de um vazio infantil que não merece o menor respeito. Não em questões destas, não num assunto tão primário.
Em Fevereiro vamos perceber que espécie de povo somos realmente...

terça-feira, janeiro 16, 2007

O blog está a internacionalizar-se


Amadeo de Souza Cardoso


A grande retrospectiva Amadeo esteve imenso tempo na Gulbenkian, mas como é óbvio tive que deixar para o fim... Sábado foi feita uma maratona, com as portas da exposição abertas toda a noite ininterruptamente. Pensei que às 2 da manhã entrava sem problemas, mas era mentira, estavam mais duas horas de fila, o que me deixava uma hora demasiado tardia para entrar. A exposição demora em si cerca de uma hora para ser vista e às 5 da matina ninguém tem cabeça para coisa nenhuma. Voltámos no dia seguinte, às dez da manhã estava uma hora de espera, quando saímos ao meio-dia a fila já ultrapassava as 3 horas para entrar.
Fiquei contente por ter ido, a espera não me incomodou, a companhia era fantástica, tudo correu bem. É de assinalar é a tremenda adesão das pessoas a este evento (ouvi cerca de 100 mil visitantes), no meio da histeria generalizada foi um fenómeno de massas que ultrapassa o gosto pela arte. Muitas exposições já foram feitas com figuras de renome e nunca se perdeu a cabeça desta maneira, aliás o museu de Amarante onde estão inúmeras obras do Amadeo não regista, nem nunca registou enchentes. Foi portanto um fenómeno de histeria, de tenho que estar onde todos estão, de exagero, de moda, como o apoiar da selecção, ou pôr lenços brancos por Timor. Seja como for, e apesar de tudo, é de salientar que é a primeira vez que vejo isto acontecer com um facto cultural, pior ainda, com uma exposição. E seja porque motivo for é sempre bom ver as pessoas na rua sem ser pelo futebol...

Musica da Semana

O site onde alojo as músicas está em baixo, e não consigo encontrar um substituto à altura. Vejo-me forçado a limitar-me às musicas disponiveis na net, o que me dá um leque de escolhas reduzido. Sendo assim esta semana fica com a melodia de Coldplay, banda britânica que atingiu sucesso imediato com o seu primeiro CD e que está tão em voga. Ladies and Gentelmans, the soothing sounds of... Fix You...

segunda-feira, janeiro 15, 2007

Flags of Our Fathers

Clint Eastwood escolheu para o seu projecto de 2006 não um mas dois filmes. Após os fantásticos multi-premiados Mystic River e Million Dollar Baby, Eastwood escolheu dois dramas históricos que se centram na mítica batalha de Iwo Jima na Segunda Guerra Mundial. O primeiro filme Flags of Our Fathers, acompanha três soldados que foram fotografados a erguer uma bandeira, e nos efeitos que essa imagem teve no povo americano. Não é um filme de guerra, é um filme de personagens, de três homens que, sem ter feito nada de especial, são considerados heróis por causa de uma foto, e manipulados pelo exército e pelo governo para angariar mais dinheiro para o esforço de guerra. O segundo filme, Letters From Iwo Jima, reconta essa batalha do ponto de vista dos japoneses.
Este fim de semana assisti ao primeiro, e apesar de já ser lugar comum não me canso de repetir, se Eastwood nunca foi um grande actor, ícone do cinema de acção dos anos 70, como realizador é dos mais maduros e profundos da sua geração. No argumento colaborou de novo com Paul Hagis (argumentista e realizador de Crash e argumentista de Million Dollar Baby e Casino Royale), o que dá à história um cunho de qualidade. Este é um filme clássico em toda a sua construção, um desenvolvimento narrativo primoroso, muito bem filmado, com uma fotografia impecável de uma cor esbatida lindíssima, com momentos de uma tensão imensa em contraste com uma história humana pungente. Com um elenco sem estrelas mas como de costume com actores na verdadeira acepção da palavra, Flags of Our Fathers é um dos grandes filmes do ano. E se os rumores de que Letters From Iwo Jima é ainda melhor forem verdade, então estamos perante uma dupla absolutamente extraordinária.
Imperdível...

sexta-feira, janeiro 12, 2007


A segunda aula de casting acabou por ser a primeira depois do desperdício de segunda-feira. Aquecimento inicial sem o relaxamento a que estamos habituados (isso viria mais tarde), mas professores diferentes têm, como é óbvio, técnicas diferentes. Em seguida massagem, juntámo-nos a pares e gastámos o nosso tempo a explorar o corpo do outro. Seja em que situação for, massagens é sempre algo que aprovo, gosto de as fazer e ainda mais de as receber, o que, para alem do propósito de relaxamento e desinibição em relação ao corpo alheio, me dá sempre imenso gozo. Em seguida trabalho sobre o texto escolhido. A Sofia queria dar dicas individuais, mas cometeu quanto a mim dois erros, primeiro foi esquecer-se que somos para cima de 20 alunos o que torna ineficaz querer ler os textos de todos e falar com todos, se gastar 5 minutos com cada um está uma hora e quarenta só a ler e dar dicas. O segundo foi querer dar imagens suas, se o trabalho do Método é utilizar experiências pessoais, as experiências alheias são obviamente inutilizáveis. Não tanto que falasse da sua vida, mas do seu universo. Dizer a um colega para pensar num quadro que lhe diga muito é pressupor que ele tem na pintura um universo próximo, quando pode não ser verdade (e não era), para ele pode funcionar o cinema, a música, o teatro ou outra coisa qualquer. Quanto a mim já tinha um universo sensorial escolhido para este trabalho, um local e uma pessoa por onde explorar. A questão é que escolhi um texto que fala de um tema que me é próximo. A utilização da pessoa que escolhi como referência para este trabalho teve consequências inesperadas, tendo a Sofia que intervir duas vezes para que eu conseguisse acalmar e regressar a um estado de menor tensão. O primeiro passo que é o da libertação das emoções começa a ser dado. É preciso agora controlá-las.
Próxima segunda outro capítulo...

quinta-feira, janeiro 11, 2007


Por motivos que me são alheios hoje vim para o escritório por cima de terra. Desta vez sentei-me à janela e olhei para Lisboa pela manhã, coisa que já não vazia há algum tempo. Não sei bem porquê mas estava estranhamente calmo, indiferente ao trânsito ou aos insultos esporádicos que se ouviam à greve do Metro, ao percurso dos autocarros alternativos, ou à celeridade dos motoristas. Entrei no Rossio, rapidamente me vi nos Restauradores. Após a visita não anunciada de uma chuva indesejada, o céu regressou ao seu azul habitual, banhando Lisboa com uma luz plácida em tons de caramelo. Liberdade acima, os enfeites de Natal descansavam de um árduo labor, espraiando-se junto às bandeiras amarelas do Dakar, que anunciavam uma festa já partida. Por entre o dourado das folhas caducas o verdejante das palmeiras contrastava, ao lado dos picos nus de árvores despidas. Chegado à Rotunda o Marquês olhava imponente a Avenida, com um leão a ladeá-lo. Uma gaivota pousou insolente na sua cabeça, indiferente à fera que estava a seu lado. (Linha amarela, Campo Grande, quem vai para o Sr. Roubado?) fechei os olhos... Hoje está um dia de praia, de Guincho, de Sintra, de errar pelos jardins da Regaleira, de sentir a areia nos pés, de cheirar o verde místico da serra. Hoje não é dia para estar aqui, olhos arregalados, em frente de um ecrã demasiado pequeno, a ver o dia esvair-se lá fora...

quarta-feira, janeiro 10, 2007

Isto é realidade não é ficção!


A cena a seguir descrita passou-se numa insuspeita repartição de finanças, onde um conhecido meu se dirigiu para abrir actividade como profissional liberal e trazer a sua caderneta de recibos verdes. Após longa e habitual espera foi atendido...


  • Boa tarde

  • Boa tarde faça favor

  • Eu sou escultor e queria abrir actividade, pensando já na hipótese de poder vir a dar aulas.

  • Escultor hein?

  • Sim

  • Ora deixe cá ver... Então o senhor compra materiais, transforma materiais e vende materiais certo?

  • Bem... nunca tinha visto isto dessa forma... mas sim, é mais ou menos isso...

  • Ora deixe cá ver... (folheia incessantemente um monte de papel)... ora que isto... (o tempo passa)... pois bem... hum... olhe que isto está complicado!

  • Pois...

  • Portanto... AH! Encontrei. O senhor vai ser... Comerciante retalhista de artigos para o lar!

  • Vou quê?

  • Então o senhor compra materiais, transforma materiais, vende materiais...

  • Sim sim, mas e se for uma escultura pública? Arte de rua?

  • Eh lá... Pois isto assim complica-se... Hum... (volta a folhear o mesmo maço que anteriormente)

  • Oh minha senhora...

  • Um momento, um momento... Lá está, encontrei, desta é que é... Comerciante retalhista... no geral!

  • Mas minha senhora, eu sei que existe uma categoria que se chama escultor, existe essa profissão nos vossos livros.

  • Sim, mas perceba, você compra materiais, transforma materias, vende materiais...

  • Sim, mas e escultor?

  • Espere um segundo que vou falar com o meu chefe. (Levantou-se. O chefe à distância fazia um ar circunspecto enquanto ouvia a explicação da sua subalterna. Apoiando a o queixo na mão acenava com a cabeça, trocando umas palavras breves e desaparecendo em seguida para eviar confusões. Retorna a senhora). Pois...

  • Sim?

  • O meu chefe concorda comigo, comerciante de retalho no geral, você compra materiais...

  • Sim já percebi, pronto deixe lá isso obrigado.

E assim saiu um escultor, com obra feita e exposta, de uma repartição de finanças catalogado como comerciante de retalho no geral. A minha questão é... e para escultor quem se qualifica?

terça-feira, janeiro 09, 2007

Regresso


Ao fim de duas semanas voltei ao Chapitô. O Bruno está a ensaiar a peça Frozen que vai estrear no D. Maria a 17 de Janeiro e portanto estas primeiras duas semanas ficaram a cargo da Sofia Gonçalves. Em quatro sessões vamos fazer um pequeno workshop sobre casting e ontem foi a primeira aula.

Começámos com o pé errado.

Em primeiro lugar gastamos uma aula em apresentações. Percebo que a professora não nos conhece, mas queimar uma aula em quatro é notoriamente exagerado. Principalmente quando a última aula vai ser a simulação do casting, portanto de 4 sobram 2 aulas para treinar.

Em segundo lugar é daquelas pessoas que criam em mim uma antipatia natural, o sorriso falso e o riso forçado sempre me deixaram com comichões.

Depois não esquecer que uma atitude agressiva (mas desimulada) não é a abordagem mais apropriada. Ela pode achar que O Método é brilhante, mas o facto de alguem ter objecções a alguns pontos não merece as respostas rispidas e duras que teve.

Alguns comentários foram completamente despropositados, como dizer numa aula que tem dois terços de alunos de primeiro ano que é "absolutamente contra a castração a que os alunos de terceiro ano são forçados por terem uma turma tão inexperiente!". A senhora sente-se revoltada com a castração, mas é a única, nunca vi nenhum aluno de terceiro ano queixar-se - muito pelo contrário - nem o Bruno (professor desta aula) considera este um passo errado, para além de atacar sem propósito os alunos de primeiro ano que estão lá apenas para aprender.

Por último a forma como lidou com o Fábio, aluno com mongolismo da turma, foi arrepiante. Pura e simplesmente ignorou-o quando ele quis intervir pela terceira vez. Eu sei que ele se repete, que ele pode ser inconveniente, mas não se vira costas a ninguem enquanto esta fala, muito menos a alguem assim...

Mas pode ser só embirração minha, como diz um colega meu: não negues à partida uma ciência que desconheces.

Musica da Semana

Se o ano começou muito bem com R.E.M. achei que a seguir era preciso levá-lo para outro nivel.
Janis Joplin é dos elementos mais marcantes da musica americana dos anos 60, personificando o espírito rebelde da época. Live fast die young é um lema que se pode ligar a muitos dos icones da época, e Joplin não foi excepção. Morreu aos 27 com uma overdose de heroina a meio da gravação de um album. A sua voz rouca e potente, a sua musica, a sua aura aventureira perdura até hoje.
De uma grande senhora:Kozmic Blues

segunda-feira, janeiro 08, 2007

Babel

"Vinde, desçamos e confundamos ali a sua linguagem, para que um não entenda a linguagem de outro... o SENHOR os dispersou dali pela superfície da terra..."
O último filme de Alejandro González Iñárritu, autor de 21 Gramas e Amores Perros, é mais uma pequena gema saida da mente deste realizador mexicano. 4 histórias em 3 continentes, uma família marroquina, um casal americano, uma mulher mexicana e uma rapariga japonesa, todas interligadas por um ponto comum, mas que partilham mais do que essa simples ligação. Este não é um filme de história, nem de actores, este é um filme de realizador, de autor, e principalmente de emoções. A dificuldade de falar de comunicar, de entender o outro é o tema central que leva inexoravelmente ao isolamento, à solidão, seja esse isolamento físico (como na familia marroquina), emocional (como no casal americano), social (mexicana) ou humano (no caso da japonesa e da sua absoluta necessidade de afecto). Isolamento, dor, sexualidade, perda e redenção são as linhas mestras de uma história que atravessa dialectos.

Brad Pitt, Cate Blanchett, Gael García Bernal são as vedetas que, apesar de terem bons papeis, não são a chave nem o motor de um conto tenso, terno e humano.

sexta-feira, janeiro 05, 2007

A emissão prossegue dentro de momentos

arg me maty

komo?

lol, pois esquece
dislexia
ou tentativa falhada de falar á pirata
ou
tristes devaneios de bicho maluco
ou
comi algo estragado ontem ao jantar (será dos olhos verdes?)
ou
é a última vez que marro contra uma porta

fds à porta!!!

que queres dizer?
tens duas hipóteses
ou estás a fazer a exclamação comum a todos os tugueses neste momento fim de semana à porta e aí digo: inda bem valha-nos deus
ou então
dizes
foda-se a porta sendo solidária com a minha pobre cabecinha ao que respondo obrigado

lolololololol

qual é qual é? qual éééééééé?????
não perca mais um episódio de : antes tu que eu!

bateste mesmo em algum lado

hein? hein? quê? vai de onde? ah olá bom dia... que tal essas férias? muita praia e sol? muito atum em lata? muita cerveja morna com torresmos?

calma, calma, fica aí onde estás, que eu ja ligo pra te irem buscar

onde estou? onde estou???? quem? quem vem lá? quem és tu???? isso é a tua cara ou estás de pernas para o ar? tens um bacio na cabeça ou és apenas feio? onde vais? que se passa??? AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHH!!!!!!!!!! filho do demo... AAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHH!!!!!!!!!!! cornudo trombudo... AAAAAAHHHHH!!! AAAAAAAHHHHHH!!!! as dores as dores... ai lindinha olhós malmequeres!

lolololololol

ufff pronto, pronto, já estou mais calmo, já tirei o algodão da boca, já respiro pelo cano como dantes, ai as tertúlias a morrer, quem te viu e quem te vê, sinopse curta da minha vida: nunca esteve onde era chamado... quem eu? não eu não tu! ah sim, assim sim, já concordo, quem vem lá que venha por bem, e senão apague a luz e tire a roupa que o resto é com as galinhas

cruzes credo

hoje se vieres faço fondue, mas tou sem gás no fogão portanto esquece lá a sardinha assada, não tem mal que também não toco violino, antes fosse que mal sinto os dedos, ai os dedos os dedos, essas cartas tão maradas, do avesso ninguém sabe quais são... ai os dedos os dedos...
senhoras e senhores retomamos a emissão dentro de momentos....

The Queen

Antes de mais é preciso sublinhar a coragem que implica fazer um filme sobre figuras públicas que, não só estão vivas, como se encontram nos mesmo papeis em que se encontravam na altura. Aliás, falar de eventos recentes, sem ter um distanciamento histórico é sempre complicado, corre-se o risco de ser tendencioso, agressivo, ou exactamente o oposto, abordando os temas com demasiado cuidado, tornando-se distante, frio, inócuo.
The Queen (A Rainha) é o último filme de Stephen Frears, cineasta inglês responsável por filmes premiados como Mrs Henderson Presents, Dirty Pretty Things (Estranhos de Passagem), High Fidelity (Alta Fidelidade) ou Dangerous Liaisons (Ligações Perigosas). O filme centra-se nos eventos que ocorreram logo após a morte da princesa Diana, quando Tony Blair tinha acabado de ser eleito primeiro-ministro e a família real parecia ter demonstrado o maior desprezo pelo luto nacional, sendo vítima de enorme contestação. Frears propõe-se contar o que se passou nesses dias, algo que o público nunca viu.
É um filme completamente british, na sua história e personagens obviamente, mas também no seu tom contido, na sua belíssima fotografia, na discreta nobreza que o rodeia.
Se contar esta história é arriscado (afinal Tony Blair ainda é primeiro ministro, a Rainha Isabel II ainda é soberana do país e a morte da princesa algo muito recente), mais arriscado ainda é interpretar o seu papel principal. A árdua tarefa recaiu sobre Helen Mirren (Gosford Park) que a desempenha de forma soberba. Não só replica a pose, gestos e majestade de tão conhecida figura, como lhe institui um carácter humano, uma profundidade de sentimentos sempre sob a pele, nunca explícitos, que fazem desta uma performance digna de aplauso.
The Queen é um grande filme, sem a parafernália do espectáculo visual americano, nem grandes tiradas operáticas, mas que tem uma suave beleza que o prespassa.
Sem dúvida nenhuma um dos grandes candidatos aos Óscares deste ano.

quinta-feira, janeiro 04, 2007

The Prestige

Christopher Nolan foi catapultado para o sucesso com a sua segunda longa-metragem Memento, um filme engenhoso, único na sua construção, que conta a história de um homem que tem amnésia, mas que apenas se esquece dos eventos recentes, sabe o nome, quem é, a sua vida, mas não se lembra do que fez há meia hora. Todo o filme é construído de trás para a frente, recuando em todos os pontos em que ele fica sem saber onde está ou o que está a fazer, levando o espectador a sentir o que o personagem sente, num thriller tenso onde a dúvida se mantém até ao fim.

Desde então a expectativa tem sido grande em saber quais seriam os passos seguintes de tão engenhoso criador. Foram três Insómnia, Batman Begins e o seu último projecto The Prestige, todos eles sólidos na sua estrutura, mas clássicos, bom entertenimento mas pouco mais.

The Prestige - O Terceiro Passo, segue a história de dois ilusionistas que se odeiam e a sua luta para se suplantarem mutuamente, nos finais do século XIX. Com Hugh Jackman, Christian Bale, Michael Caine, Scarlett Johansson e David Bowie (um Nikola Tesla absolutamente irreconhecivel), tem um elenco de luxo que se mantém forte em todas as frentes, apesar de por vezes parecer que há actores subaproveitados em pequenos papeis.
A reconstrução de época é primorosa, não sendo de admirar estatuetas para melhor direcção artística nesta época de prémios que começou com os Globos de Ouro.
O ponto forte da fita é o argumento, que procura surpreender-nos constantemente. Até certo ponto consegue-o, mas sem deslumbrar, e dando espaço de manobra para se descobrir as surpresas finais com algum avanço.
Há uma comparação que é inevitável com O Ilusionista, ambos os filmes têm a mesma temática, passam-se na mesma época, estrearam com um mês de diferença e tentam surpreender o espectador com diversos plot twists. Em todos os pontos The Prestige sai a ganhar.
Não deixa grandes marcas nem memória, mas como objecto de entretenimento funciona bem, valendo as duas horas de atenção.

quarta-feira, janeiro 03, 2007

Star Wars


Abriu no dia dos meus anos mas só na pausa que fiz no Natal tive oportunidade de a ir ver. A exposição do Star Wars no museu da electricidade, com os seus 2000m2, aguçou-me a curiosidade. Os 10 euros por cabeça não são convidativos, mas a promessa de ver algo inesquecível era bastante apelativa.
Em termos de objectos é impressionante, naves que foram usadas nos filmes, fatos de toda a saga, esboços, desenhos, miniaturas, videos a explicar os efeitos, o R2D2, o C3PO e claro Darth Vader.
No entanto em termos expositivos é de uma pobreza atroz, o espaço é muito bom mas completamente subaproveitado, tudo está disposto sem o mínimo de lógica ou sequência, plantado dentro de caixas de vidro, deixados como se ao acaso. Torna-se desinteressante, monótono, triste, o que é absolutamente incrível sabendo a matéria prima de que dispõe, o universo fantástico em que se insere e o entusiasmo expectável que os fãs demonstram.
Mas se a curiosidade mesmo assim apertar ainda está até 14 de Janeiro.


Exposição Star Wars
Museu da Electricidade - Belém
3ªs a 5ªs e Domingos das 10H00 às 20H00 / 6ªs e Sábados das 10H00 às 22H00

Preço: 10€, Colaboradores EDP: 8€, crianças com menos de 7 anos: gratuito

terça-feira, janeiro 02, 2007

Borat: Cultural Learnings of America for Make Benefit Glorious Nation of Kazakhstan

Conheço o personagem Borat ( criação do actor inglês Sacha Baron Cohen) através de diversos sketches que circulam a net há já algum tempo. Borat, um reporter do Cazaquistão, anda por Inglaterra a tentar aprender os costumes do povo local. Este conceito foi passado a cinema.

O filme cujo título vou abreviar apenas para Borat, trata da viagem desse reporter para os EUA para aprender a sua cultura e regressar ao país de origem com um documentário feito sobre a América. A fita, tal como os sketches, tem como base uma lógica de Apanhados, onde o quase bárbaro mas bem intencionado Borat faz as coisas mais inimagináveis por causa das "diferenças culturais" que existem com as pessoas com quem se cruza, e que supostamente não sabem que ele é um actor inglês. É um sucesso de bilheteira colossal e foi inclusivé nomeado para dois Golden Globes, Melhor Filme e Melhor Actor na categoria Musical/Comédia.

A ideia que me tinha sido vendida era a de um homem que através da sua ingenuidade põe a nu as contradições do povo americano. No entanto os únicos que são gozados e humilhados são os Cazaquistaneses, que são apresantados como um povo imbecil, retrógrado, porco, sujo, pobre, sub-desenvolvido, que vive em barracas e de moralidade duvidosa, com cenas de incesto à mistura.

Vamos por partes, o Cazaquistão é uma ex-républica soviética, o sexto maior país do mundo em termos de área, com a população com 99,5% de literacia de adultos, taxas de crescimento do PIB acima dos 9% anuais, uma dívida pública e um défice do Estado inferiores ao nosso por exemplo, sendo o sector energético o seu sector económico dominante. A imagem de um país de ciganos imbecis está o mais longe possivel da realidade, e se para nós portugueses isso pode dizer pouco, não achariamos o mesmo se fosse Portugal assim representado. Só revela um nível de ignorância extrema por parte de quem faz a caricatura e uma total falta de respeito pelas pessoas.

Em segundo lugar, um inglês a gozar com os ingleses tem graça, a gozar com um povo que desconhece por completo é, no mínimo, de mau tom.

Mas ainda vá, as coisas podiam mesmo assim ter piada, apesar de ser filmado na Roménia e com música de um Jugoslavo. Borat no entanto, revelou-se a experiência mais degradante que já tive numa sala de cinema. Um homem com um saco de fezes à mesa de jantar não tem graça, é nojento, um gordo gigantesco a masturbar-se com fotos da Pamela Anderson não tem graça, é nojento.

Todo o filme faz lembrar o nivel de humor e inteligência de um Jackass, com gente que come a sua própria urina, mas com uma diferença, ao menos no Jackass eles tinham a decência de gozar consigo próprio.

É um filme errático e repugnante, mas olhando para a reacção do resto das pessoas devo ser eu que tenho um estômago demasiado sensivel.


2007

Fim de férias, de Natal, das festas, prendas e comida a mais. Os 24 e 25 com a família, o 31 com amigos, tudo nos conformes.
2007 começou, e como de costume as resoluções de ano novo trazem promessas de mudança. Este ano vai ser de mudança, tem que ser para que a vida "pule e avance". Para arrancar o ano da melhor forma e para que a mudança seja verdadeira, vamos virar as coisas do avesso, vamos acabar com o mundo tal como o conhecemos!

(e para dar uma mãozinha aqui fica R.E.M. - It's the end of the world as we know it)