quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Letters From Iwo Jima

Letters From Iwo Jima é a continuação de Flags of Our Fathers, a batalha de Iwo Jima vista pelo lado dos japoneses. Curiosamente, tal como Flags of Our Fathers, este não é um filme sobre a Segunda Guerra Mundial ou sequer sobre a batalha em causa. É um filme, como todos os filmes de Eastwood, sobre pessoas, os seus sonhos e os seus fantasmas, aqui retratados nas cartas que escreveram às familias. Dos preparativos para o confronto, à descoberta do inimigo como pessoa, das vidas antes daquela ilha, às questões mais profundas como honra, coragem, amor e camaradagem, Letters From Iwo Jima, é um hino ao ser humano, à sua capacidade de se superar, à sua inteligência e espirito de sacrificio. É também um inside look a uma cultura cujas raízes e tradições nos escapa, e uma enorme vénia a Kuribayashi, o general que planeou a defesa daquela ilha, sem apoios, e contra todas as probabilidades. Um general que tinha não só um conhecimento militar alargado, mas que tinha passado muitos anos nos EUA, conhecendo o seu inimigo, e partilhando de alguns ideais ocidentais, facto que levou a que fosse mal visto por diversos colegas de trincheiras.
Um filme genial, com uma fotografia notável (em linha com o seu predecessor), que nos aborda, nos envolve e nos leva a descobrir um mundo sem herois nem vilões, mas de gente que sofre e luta por uma causa que os ultrapassa.

E as costas??


Desde quarta passada que todas as aulas passaram a ser doreccionadas na preparação da peça. Novos quadros são acrescentados e sequências adicionadas, num trabalho rendilhado que avança a bom passo, mas com fim incerto. Não vai ser uma peça narrativa, isso é certo, mas se o objecto final vai ser interessante ou não, ainda estou para descobrir. Temos tempo, mais 3 meses de ensaios dissiparão as dúvidas que existirem. Percebo o que o Bruno quer fazer, não tenho a certeza se a concretização será a melhor...
Neste momento estou a sentir as reprecursões da aula de segunda... Sem aquecer saltei, lutei, rastejei pelo chão... agora as costas matam-me... Hoje tenho que ter mais cuidado...

terça-feira, fevereiro 27, 2007

Musica da Semana

Uma das cenas visualmente mais interessantes da peça que estamos a preparar no Chapitô é um beijo apaixonado ao som de um discurso delicioso da Lucy Liu após decepar um homem que pôs em causa a sua ascendência americana. O contraste da violência do acto, a calma explosiva do discurso e o ardor do beijo é muito interessante. Como tal, aqui fica, não o discurso, mas uma música de Nancy Sinatra desse filme. Bang, Bang...

Rocky Balboa

Sylvester Stallone tem 60 anos e a carreira de sucesso construída ao longo dos anos 80 e 90 está agora em ruínas, após uma série desastrosa de fracassos, muitos dos quais não chegaram sequer às salas de cinema. Para voltar à mó de cima resolveu voltar-se para os filmes que fizeram dele uma estrela, os eternos Rocky e Rambo. A catástrofe parece iminente, senão comercial, pelo menos em termos de filme. Um homem de 60 anos aos murros no ringue? Surpreendentemente o resultado é positivo.

Antes de mais é preciso dizer que Rocky Balboa (o sexto filme da série) é um filme para os fãs. Quem não cresceu com Rocky, quem não viu os seus filmes na adolescência, por mais ridículos que a maioria deles seja, quem não conhece os personagens, os locais, a música, não consegue apreciar este filme.
Rocky está velho e não o esconde. Usa óculos, tem dores, sofre, o filho já saíu de casa e trabalha, ele está sozinho no mundo após a morte da mulher. E precisa provar a si próprio que ainda tem algo dentro dele para dar.
Estão lá todos, os locais, a família, o treinador (que inicialmente treinou Apollo Creed), a escadaria, o talho, a velha Filadélfia, a sequência de treino, a luta irrealista, Spider Rico (o primeiro adverário que conhecemos no original) e Marie, a rapariga que no primeiro filme o manda passear após ouvir um sermão. É uma viagem nostálgica por um passado que Rocky, Stallone e o espectador partilham, uma viagem de uma inocência desarmante, por momentos a roçar o piroso, mas terna, emocional. O cinema também tem estes momentos, em que sem olhar para a excelência do filme, nos deixamos apenas ir, nos sentimos em casa. E é um adeus, um fechar de capítulo. Rocky, como Stallone, está velho e precisa mostrar que tem algo para dar. E quem o conheceu estes anos todos merece dar-lhe esta oportunidade final.

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

And so it was...

Mais uma noite de prémios, sem sobressaltos nem grandes surpresas. The Departed foi o grande vencedor, 4 Oscares, Melhor Filme, Realizador, Argumento Adaptado e Montagem, a consagração veio pela mão de três dos maiores nomes da sua geração, que começaram nestas vidas consigo Steven Spielberg, George Lucas e Francis Ford Coppola. Babbel foi o grande derrotado, apenas um Oscar e logo pela Banda Sonora. Little Miss Sunshine lá levou o seu aplauso com o Melhor Argumento Original e, surpresa da noite, Melhor Actor Secundário para Alan Arkin. O resto foi o que se esperava, Helen Mirren com The Queen, Forrest Whitaker com Last King of Scotland, Jennifer Hudson com Dreamgirls, foram os outros vencedores na área da representação. Foi a noite tambem de Al Gore, sendo este um factor importante, a Academia virou política assumidamente, Oscar de Melhor Documentário, Melhor Canção (contra 3 nomeações de Dreamgirls) para An Inconvinient Truth, bem como cinco minutos em palco com Leonardo DiCaprio para promover supostamente a luta pelo meio-ambiente, mas com diversos piscar de olho à presidência. Elle DeGeneres não deslumbrou, mas tambem não compromoteu como apresentadora.
Para o ano há mais.

domingo, fevereiro 25, 2007

Favoritos e Preferidos - Melhor Filme

Sim... The Departed é o grande favorito, mas o único que não ganha de certeza é The Queen, leva Melhor Actriz e deve ser suficiente. Scorsese está na linha da frente, mas Clint Eastwood sempre se mostrou um adversário temível e Letters From Iwo Jima é um excelente filme. Babel ganhou o Globo de Ouro e recebeu Melhor Realização em Cannes, mas o grande outsider que pode ser a surpresa da noite é Little Miss Sunshine, uma comédia diferente, e um grande favorito do público, que tem contra si não ter sido nomeado para Melhor Realizador e ser uma comédia, género que a Academia normalmente não premeia. Creio que é entre Little Miss Sunshine e The Departed. Pessoalmente, de todos os nomeados, acho que Letters From Iwo Jima é o filme mais brilhante. Daqui a poucas horas se saberá.
Todos os nomeados em www.oscar.com

Favoritos e Preferidos - Melhor Realizador

Scorsese está há muitos anos a merecer um Oscar nesta categoria que lhe tem fugido para os mais variados adversários. Pois tudo indica que este será o seu ano e que The Departed vai levar a estatueta para casa... a não ser que Babel tenha aqui o seu prémio de consolação e Alejandro Gonzáles Iñárritu leve a estatueta... Pouco provável... Quanto a mim Scorsese seria o justo vencedor.

Favoritos e Preferidos - Melhor Argumento Original

Este poderia ser o Oscar para Babel, como prémio de consolação, mas Little Miss Sunshine é um favorito do público e apresenta-se em força. Ganhou também o Screen Actors Guild Award. Pessoalmente iria para Babel.

Favoritos e Preferidos - Melhor Argumento Adaptado

Há quem diga este ser o ano de Scorsese e que The Departed vai ser o grande vencedor dos Óscares. Nesta categoria apresenta-se como o principal candidato, tendo já ganho o Screnn Actors Guild Award. Aqui o meu coração divide-se entre The Departed e Little Children, que é um dos meus filmes favoritos da temporada (apesar de ser pouco provável que ganhe alguma coisa).

Favoritos e Preferidos - Melhor Actor Principal

Há pouco mais de três horas saí da sessão no Alvaláxia do filme que vai levar este Óscar para casa, The Last King of Scotland, e o actor é Forrest Whitaker, que está aterrorizante como Amin, ditador facínora do Uganda durante os anos 70. É mais um que já ganhou este ano todos os prémios que há para ganhar e os Óscares não se afiguram diferentes. Concordo uma vez mais plenamente com esta atribuição.

Favoritos e Preferidos - Melhor Actriz Principal

Aqui não há dúvida, Helen Mirren brilhante como rainha Isabel em The Queen leva o Oscar para casa, ganhou tudo o que havia para ganhar este ano e eu concordo plenamente.

Favoritos e Preferidos - Melhor Actor Secundário

O prémio aqui deve recaír de novo sobre Dreamgirls, desta vez para Eddie Murphy, que levou já para casa o Globo de Ouro e o Screen Actors Guild Award. Pessoalmente votaria em Jackie Earle Haley que tem um desempenho de cortar a respiração como um pedófilo em Little Children.

Favoritos e preferidos - Melhor Actriz Secundária

Este ano das cinco nomeadas o Oscar deve ir para Jennifer Hudson de Dreamgirls, que para além de diversos prémios da crítica levou para casa um Globo de Ouro, um BAFTA (os Óscares ingleses) e o prémio do Screen Actors Guild (sindicato dos actores). Pessoalmente gostaria que fosse para Rinko Kikuchi pelo seu soberbo desempenho como uma surda à procura de amor em Babel.

A noite mais longa...

É hoje, à uma da manhã hora de Portugal começa a 79ª edição dos Óscares, mais uma noite sem dormir. A tensão acumula, prinicipalmente quando se têm favoritos, para saber se este ano a Academia acerta. E foram diversas as vezes em que não acertou. Basta ver que no ano de The Elephant Man de David Lynch, de Tess de Roman Polansky ou de Ranging Bull de Scorsese, o vencedor foi um esquecido Ordinary People de Robert Redford. No ano de Taxi Driver, o vencedor foi Rocky, ou que no ano de Cleopatra venceu Tom Jones, ou que nomes como Alfred Hitchcock nunca venceram nenhum Oscar. Nos últimos anos então a mediocridade tem predominado, filmes como Shakespeare In Love ou Beautiful Mind foram multi-premiados, filmes esses que são, no máximo, interessantes, mas não são de todo os melhores filmes de ano, nem aparecerão em nenhuma História do Cinema. Seja como for, os Oscares são o reflexo de como a indústria se vê a si mesma, e aquilo que ela valoriza ou quer destacar. Ninguem pode negar por exemplo, as questões étnicas por detrás das vitórias de Denzel Washington e Halle Barry nas categorias principais de representação em 2002.
Esta noite celebra-se o cinema, bem ou mal, a mais importante indústria cinematográfica do mundo homenageia hoje os seus, e o mundo escuta...

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Frases que não queres ouvir...

... da tua professora: vem ao quadro.
... da tua mãe: fazes o favor de chegar aqui!
... da rapariga por quem te apaixonaste: gosto de ti mas como amigo.
... da namorada: estou atrasada uns dias...
... da mulher: estão aqui os papeis para assinares.
... do padre: dez pais nossos e dez ave marias!
... do policia: então 1,2 hein?!
... do IRS: auditoria!
... de um funcinário público: primeiro tem que comprar o impresso 14, preenchê-lo, trazer as fotocopias que lhe disse e voltar para aqui...
... do filho: aconteceu uma coisa ao carro...
... do juiz: culpado!
... do locutor de rádio: trânsito lento...
... do parceiro de acrobacia: ups!
... do médico: sinto muito...

Mas acima de tudo NÃO QUERES OUVIR do teu mecânico: sabe, aquele carro que veio para a inspecção e que fazia uns barulhinhos, afinal vai ter que levar uma embraiagem nova e o preço total do arranjo vai ser igual ao rendimento que tem disponivel para o mês inteiro!!!!

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Peça!


O trabalho na peça de fim de ano começou ontem. O Bruno tinha esquematizado uma série de exercícicos sensoriais e conforme os realizávamos ele ia escolhendo pessoas. A seguir, com o trabalho desses exercicios (e algum outro em certos casos), montou pequenos quadros com os alunos, ao som de música. Não necessáriamente quadros narrativos, ou cenas, mas quadros emotivos, estéticos, bases de trabalho, numa peça que se quer multidisciplinar. A melhor comparação que arranjo é com o último trabalho do Meridional, mosaicos de gente e não histórias - pondo obviamente de lado todo o mérito técnico e artístico da peça Por Detrás dos Montes, com a qual o nosso pequeno bando amador não pode nem deve nunca ser comparado.
Ainda não tenho a certeza do rumo final que tudo isto vai tomar, até porque com as faltas cíclicas de alguns colegas é complicado perceber quem fica e quem sai, mas ontem foi dado o primeiro passo, a ver vamos como corre.

quarta-feira, fevereiro 21, 2007

Scoop

Há daqueles realizadores que pela obra que já deixaram são já considerados mestres no seu ofício. Woody Allen é um deles. E se filmes como Small Time Crooks ou The Curse of The Jade Scorpion não são marcos de referência, o seu último título Match Point foi um dos grandes filmes do ano passado.

Scoop é o regresso do realizador à light-comedy, sem grandes pretensões nem grandes mensagens, apenas um piscar de olho aqui e ali ao espectador mais atento, e hora e meia de boa disposição. Nada de mal com este intuito, não fosse o exagero dos personagens. A estupidez bimba do personagem de Woody Allen que não larga o seu baralho de cartas e truques baratos, a falta de gosto atabalhoada de Scarlett Johansson, com a sua estudante de jornalismo eléctrica, e o vazio absoluto do personagem de Hugh Jackman que sorri, mostra o corpo e pouco mais.
Scoop é um filme pobrezinho, a trama é linear, os personagens irritantes, a comédia batida, salvando-se os 30 segundos de Johansson em fato de banho, para os fãs mais acérrimos da actriz. Woody Allen falha por completo, não vale a pena o tempo nem o dinheiro gasto. O melhor, para os mais curiosos, é esperar pelo DVD.

terça-feira, fevereiro 20, 2007

Contigo

Quatro dias... quatro dias apenas está João Paulo Santos no Pequeno Auditório do Centro Cultural de Belém e hoje, terça-feira de Carnaval, às 16 horas é a sua última actuação. Mastro chinês... novo circo, dança, performance, não sei como definir os 40 minutos de pura magia a que tive o privilégio de assistir. Um mastro, uma cadeira, um lenço, uma pedra, um homem, cinco elementos em confronto, a levar ao extremo os limites do corpo, do físico, da Fisica, da dança. A plasticidade do corpo, em dança com os elementos, consigo mesmo, com o seu esforço e a sua leveza, a sua harmonia. Contigo é um espectáculo multi-disciplinar, que vai além da perfeição técnica, que tem uma componente artisitica, plástica, expressiva profunda. João Paulo Santos foi convidado pelo Cirque de Soleil e recusou para prosseguir uma via menos restritiva. Por este espectáculo segue no bom caminho, apetece acompanhá-lo por onde for...


Contigo

CCB- O Espaço do Tempo; O Último Momento; SACD Compositeurs Dramatiques; Festival D'Avignon

Concepção e Direcção Artística: Rui Horta; João Paulo Santos
Coreografia: Rui Horta
Interpretação: João Paulo Santos
Figurinos Pedro Pereira dos Santos
Música Tiago Cerqueira, Vitor Joaquim
Desenho de Luz: Rui Horta
17 a 20 de Fevereiro
dias 17 e 19 - 21h; dias 18 e 20 - 16h
Preço: 15€

Centro Cultural de Belém
Praça do Império
1449 - 003 Lisboa
Telefone: 21 361 24 00
Fax: 21 361 25 00
www.ccb.pt

Música da Semana

Desde 2002 que os Coldfinger não lançam nenhum album,e com o início da carreira a solo da sua vocalista Margarida Pinto, é possivel que o não façam brevemente.
Em 2000 lançaram Lefthand, uma belissima colecção de canções, maioritáriamente em inglês. Não sei definir a sonoridade, indie, electrónica, li algures trip-hop, mas a verdade é que Margarida Pinto me toca quer a solo quer na banda que a lançou. Aqui fica um pequeno sopro, The Tree And the Bird, cuja letra simples sobre amor e perda, muito me tocou... É por vezes dificil perceber o nosso papel numa relação e admitir que entre um pássaro e uma árvore o amor torna-se... impossivel.

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

Little Children

Numa comunidade suburbana o Verão decorre pacatamente. Na vida de cada pessoa um desepero calado insinua-se, até que a busca de uma saída, de uma alternativa, de felicidade faz explodir a rotina do dia-a-dia.

Todd Field não tem um grande passado como realizador, mas pode-se dizer que das poucas vezes que tenta acerta. O seu último filme, o multi-premiado In the Bedroom, era um drama tenso que foi talvez ofuscado pelo genial La Stanza del Figlio, que abordava temáticas similares. Cinco anos volvidos chega-nos este Little Children, um mosaico de dor e esperança, de humor e lágrimas, que segue uma mão cheia de personagens que lutam para sobreviver ao isolamento emocional que governa as suas vidas. E nesse ponto é brilhante, com uma construção lenta, pontuada, vamo-nos embrenhando na vida destas pessoas e descobrindo as linhas com que tecem as suas vidas e relações.
Temos realizador, mas temos também argumento, cada personagem é densa, definida, física, palpável, e surpreendente. Surpreendente nas suas revelações, mas também no rumo que tomam, escolhem e que ultimamente as define.
Se temos personagens, felizmente temos actores... e que actores, Kate Winslet recebe a sua quinta nomeação para o Oscar (a mais jovem actriz a conseguir este feito), Patrick Wilson prossegue uma escolha de projectos muito interessante (vide Hard Candy) e Jackie Earle Haley tem um papel de uma força, uma contenção, um desepero inacreditáveis.
Pecados Intimos (o título em português) está nomeado para 3 Oscares, não vai ganhar nenhum e merecia estar nomeado para muitos mais.

Um filme a ver, saborear, deixar que nos leve, nos toque e fique connosco por muito tempo...

Cuidado vilões!


Eu hoje vi um superheroi a entrar no Público... tinha capa e tudo e metia os pés para dentro...

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

Mas então?

Por causa da peça de fim de ano do Chapitô pus-me a lêr o Drácula de Bram Stoker. Conhecia bem o imaginário, tinha visto diversos filmes, desde o Nosferatu do Murnau ao Drácula de Bram Stoker do Coppola, mas nunca tinha lido o livro. Nestas coisas não há como ir à fonte.

Eu sei que o nível das coisas que tenho tido a sorte de ler tem sido bastante bom, e que portanto o livro tinha que valer qualquer coisa para se equiparar a Mário de Carvalho, Steinbeck, Cardoso Pires ou mesmo às fabulosas peças de Edward Albee ou Martin McDonagh, mas a obra de Stoker tornou-se quase mitológica, sobreviveu à passagem do tempo e reproduziu-se através do imaginário colectivo.

Desilusão... GRANDE! Narrativa linear, personagens estanques, todo o fascínio que tenho pela história (o encanto do vampiro, o poder, o amor eterno, o tormento, a pulsão sexual) são prácticamente inexistentes, Drácula é um monstro e apenas isso, nem sequer é especialmente inteligente apesar dos séculos de existência, não se percebe porque é que faz o que faz, porque é que escolheu Londres ou aquelas pessoas, e está de tal maneira limitado que nem sequer é grande adversário (não se pode mover sobre água? um ramo de roseira brava impede-o de sair do caixão? tem medo de hóstia? mas que raio?). É triste descobrir, mas a verdade é que o mito de Drácula foi construído depois de Bram Stoker, por milhares de histórias de vampiros, por livros, por jogos, por peças, por filmes que expandiram e aprofundaram a lenda.
É daqueles casos para dizer gostaste do livro? Vê antes o filme!

quinta-feira, fevereiro 15, 2007

Na tua cara


"A lua banhava as pedras soltas da calçada com uma luz azul fria. Nada mexia nas sombras da rua, nos recantos escondidos onde alma alguma se aventurava. A ruína crescia como um punho fechado em torno do pico escarpado de uma montanha perdida numa cordilheira distante. Apenas o som do vento se aventurava a rumar àquelas paragens, fazendo um concerto surdo ao qual se sobrepunha o leve rumorejar das folhas secas. Em baixo da enorme escadaria que contornava aquilo que foi em tempos um imponente castelo, uma sombra contorceu-se. Uma mão espalmada como uma estrela de cinco pontas ficou visível ao luar. Catarina levantou-se a custo. O corpo coberto de chagas, as roupas esfarrapadas, o cabelo revolto, restos de sangue seco espalhados pela cara como se de uma pintura tribal se tratasse. Pé ante pé ela foi subindo, o rosto num esgar, um misto de dor e raiva, numa mão tinha presa uma adaga, e Catarina agarrava-se a ela como se disso dependesse a sua vida. Não parava, nem pelo cansaço, nem pela dor, nem pela luz que lhe destapava as sombras, sabia estar sozinha, sabia o que tinha que fazer. No topo daquele lugar maldito estava uma mesa de mármore, um imponente altar que se mantinha orgulhoso no meio dos escombros. Deitado nele, perdido no seu sono, um homem com uma armadura gasta e uma capa rasgada pelo tempo e pela espada, repousava. Apesar do aspecto cansado, das roupas gastas, adivinhava-se nele uma nobreza, um certo ar etéreo, uma beleza fascinante que sobrevivia ao tempo e à fadiga. Era um homem duro, mas ainda assim angelical. Catarina aproximou-se e parou por um momento a observá-lo. Num movimento brusco e com o rosto inexpressivo cortou-lhe a garganta. Ele abriu os olhos com a dor e olhou-a incrédulo, como se visse alguém para alem da tumba. Catarina fitou-o quieta enquanto ele morria. Deixou cair a adaga e com o último suspiro do moribundo afastou-se olhando o mundo à sua volta. Até onde a vista alcançava estendiam-se picos escarpados de montanhas, um sem fim de cinzento sem vida, de rocha aguçada e perpétuos abismos. Catarina caiu no chão desamparada, como se o peso de uma vida se abatesse de súbito sobre ela. Agarrando os joelhos chorou convulsivamente. A sua vingança estava consumada, aquele homem estava morto, aquele homem que a abandonou aos bichos, que a deixou inanimada, cortada, ferida, que a tentou destruir, aquele homem não existia mais. E com ele desaparecia o único amor da sua vida, a quem dedicara mais que corpo, mais que alma, esperança e futuro. A única coisa que lhe restava era aquele abismo escarpado, aquele mundo de pedra vazia e nada mais."

Há duas semanas tivemos um exercício em que, no final da aula, ao som de música, tinhamos que olhar para os colegas, escolher um e a partir dele criar um personagem. Fechar os olhos, e desenhar uma pequena narrativa com esse personagem (e não com o colega). Ontem foi feito o trabalho sobre essa historia. Uma cópia entregue ao Bruno (quiçá se não servirão de base para a peça final) e depois trabalho sensorial. Recriação física do espaço e do personagem, para culminar numa improvisação, guiada pelo Bruno, em que tivemos que integrar outros colegas no nosso espaço, no nosso mundo, sem nunca o impormos, interagir, adaptar, reagir, contracenar no fundo, sem sermos autistas, sem nos virarmos para nós próprios, e estando sempre atentos ao outro, sem nunca perdermos o nosso próprio personagem...

Sem dúvida que prefiro as aulas de quarta feira, apesar de, pelo tamanho da turma, nunca se conseguir fazer um exercicio muito longo, para dar tempo a todos.
Pausa nas aulas para o Carnaval e daqui a sete dias há mais...

quarta-feira, fevereiro 14, 2007

Emoções

Sábado fui ver a anunciada última performance do Lisboa Ballet Contemporâneo, que vai fechar as portas devido a falta de fundos para manter uma produção constante, remetendo-se apenas para reposições do reportório. Após o Ballet Gulbenkian é mais um, tristemente que fecha as portas, empobrecendo o panorama cultural do país.

O espectáculo insere-se no ciclo Canto e Dança que dura até 24 de fevereiro e é uma coreografia de Benvindo Fonseca. Callas é um espectáculo de homenagem a Maria Callas, uma mistura de som, imagem, música e dança que me deixou, uma vez mais, de alma cheia.

Eu não sou um entendido em dança. O meu passado familiar, cultural, profissional e até de formação está ligado ao cinema e ao teatro. É por isso para mim estranho que, últimamente, de cada vez que olho para um palco nacional, me sinta mais emocionado, mais embrenhado, apaixonado, enebriado até pela dança do que pelo teatro. O que é incrivel é que o teatro tem, em princípio, mais armas que a dança para nos prender. Tem a palavra, narrativa, o drama, os personagens, pode-nos comover com o texto ou com a situação representada, enquanto que a dança depende apenas dos corpos e da música. E no entanto, eis que me vejo de olhos em lágrimas no Teatro Camões, e a bocejar noutras paragens. Não em todas claro, fiquei deslumbrado no Meridional, mas uma vez mais a linguagem era mais abstracta, mais perto do bailado que do teatro em si.
É estranho que aconteça, acho até preocupante que o teatro em Portugal esteja tão nu, tão vazio de ideias, de capacidade, de emoções.
Mas eu, hei-de continuar apaixonadamente a frequentar as salas de espectáculo,à espera de mais uma peça, mais uma noite que viva para sempre gravada na memória.

14 de Fevereiro



A todas as pessoas que dão afecto às horas certas, que fazem birra por não ter prenda, que confundem jantar com amar, que sorriem plasticamente e fingem ainda sentir alguma coisa, que vão na manada consumista como carneiros a caminho do pasto, que são cegos e surdos em relação a quem está ao vosso lado 364 dias por ano, que sacodem a poeira dos fatos como quem reanima uma vida, que se arranjam, vestem, pintam, mascaram sem sentido a toque de corneta... FELIZ DIA DOS NAMORADOS! Aqui fica um coração. Enjoy.

terça-feira, fevereiro 13, 2007

Ao fim de duas semanas!

Duas semanas depois voltei a ter uma aula decente no chapitô, com as voltas e reviravoltas, surpresas e outros carnavais em fevereiro nem uma mão cheia de aulas temos. Mas vou um regresso, e pelo menos esta semana as coisas parecem bem encaminhadas. Trabalho sensorial, encontrar um espaço imaginado onde nos sentissemos bem (porque raio me veio uma biblioteca por cima de um teatro com varanda para o jardim?) e muito trabalho sobre música, fox trot, charleston. Mais corpo, mais movimento (afinal às segundas é aula física), vestir roupa ao som de música, sem naturalismo, sem realismo, só com a criação e movimento plástico dos corpos, mas sempre com o trabalho sensorial (peço, formas, tecidos).
Acabou com o mesmo trabalho de há duas semanas para se escrever o texto. Serviu para quem tinha faltado.
Tudo normal, excepto o facto de aparecer um novo aluno... outro novo aluno, passados cinco meses de trabalho. O tamanho da turma não ajuda (somos quase trinta), o tempo decorrido devia desanconselha-lo, mas a mensalidade fala mais alta, mais uns trocos e mais uma pessoa que aterra ali no meio... Não faz muito sentido...

Disney?

E porque não? Em puto adorava estes filmes... na verdade ainda adoro! Dos tempos aureos da Disney (ou vá do segundo periodo de grandes filmes de animação) quando os desenhos ainda eram feitos à mão, e as dobragens em brasieliro.
Portanto, para uma semana bem disposta... aqui no mar... aqui no mar...

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

Cristina Branco

Pelos vinte anos da morte de Zeca Afonso, Cristina Branco apresenta um espectáculo no jardim de Inverno do S. Luiz, todas as sextas e sábados até 24 de Fevereiro, à meia noite.
É um ambiente intimista, como todos os concertos do jardim de Inverno, sentados à volta de uma mesa, como se fosse um piano bar. A noite promete. Zeca Afonso é bom cantado seja quase por toda a gente, e Cristina Branco intrepreta brilhantemente seja quase quem for. Juntar os dois só podia dar bom resultado. Cristina de vermelho, pequena, nervosa, com uma voz maior que o seu corpo e que a sala que a acolhe. À sua volta, quatro músicos, quatro sonoridades que se misturam e influenciam, dando corpo a todo o concerto. Surpresa... jazz. Foi essa a abordagem à música de José Afonso, jazz, e curiosamente funciona, bem, muito bem. A noite passa, voa, e quando olhamos para o relógio é uma e meia da manhã, Cristina sai de palco passando pelo meio de nós e fica por ali, a conversar, como se fosse mais um espectador, como se fosse apenas beber um copo numa noite de sexta feira.
Eu fui para casa com a alma cheia, de música, de voz, de talento, de sons e ritmos, de Zeca e Cristina, vinte anos depois ele vive no coração e na voz de todos nós.

"O meu menino d'oiro é d'oiro fino, não façam caso que é pequenino..."



Cristina Branco canta Zeca Afonso
Teatro S. Luiz / Uguru

Voz: Cristina Branco
Piano e Acordeon: Ricardo Dias
Guitarra eléctrica e acústica: Mário Delgado
Bateria: Alexandre Frazão
Contrabaixo: Bernardo Moreira

2 a 24 de Fevereiro
Sexta e Sábado 24h00
Preço bilhetes: 15€

Teatro Municipal S. Luiz
Rua António Maria Cardoso, 38
1200-027 Lisboa
Telefone: 213 257 650
Fax: 213 257 631


domingo, fevereiro 11, 2007

59,25%

... foi esta a percentagem de eleitores que foi dizer SIM à mudança de uma lei injusta, retrógrada, que perseguia as mulheres que abortavam e que alimentava o aborto clandestino. Foi uma diferença de quase 19% (59,25% pelo SIM e 40,75% pelo NÃO), uma maioria esmagadora que não deixa dúvidas quanto ao caminho a seguir. Olhando para o retrado do país, o SIM ganhou nos distritos do Sul e nos distritos urbanos, tendo sido derrotado no Norte, no Interior e nos distritos onde a Igreja Católica tem uma maior implementação, bem como nos distritos mais conservadores. Um dos grandes factores de viragem foi o Porto, que passou de votar ao lado do Norte, para passar a ter uma escolha mais urbana.
Foi o fim do referendo, mas é apenas o início da batalha, pela protecção da mulher, pela concretização da Lei, pela regulamentação de um Lei justa e equilibrada, pelo apoio à mulher e às familias, pela educação sexual e pela divulgação dos meios contraceptivos. É um longo caminho que começa em cada casa, em cada um de nós, e se estende pelas escolas, hospitais, e por toda a sociedade. Não é um caminho que se percorra com atitudes como a de uma plataforma do NÃO que defendia que se pagasse às mulheres que não recorrem à IVG o valor equivalente que é gasto com as mulheres que o fazem. Esta questão não é economicista. Abordá-la deste prisma é ridícula.
E as pessoas que adoecem por causa do tabagismo? E os toxicodependentes? E os seropositivos? E os sem-abrigo? Também se vai contabilizar o dinheiro gasto a ajudar estas pessoas e distribuir por todos os que não precisam da ajuda? É que se assim for eu reformo-me já... Pensando bem, eu não tenho cancro, nem diabetes, nem gota, nem asma, se receber algum por todos eles... fico rico! E porque não dar às mulheres que recorrem à IVG o equivalente gasto pelo Estado com todas as mulheres que têm filhos? Isso é que era uma festa! Vamos ficar todos ricos! Só se lixa a terceira idade!
Mas seja... deve ter sido uma declaração impensada feita no calor do momento... Adiante.

O primeito passo foi dado, não podemos parar por aqui. há muito trabalho a fazer. Agora sim!

SIM!

60% dos eleitores que hoje se dirigiram às urnas votaram SIM, segundo as projecções que foram anunciadas há minutos. São apenas projecções, mas com um margem de 20% sobre o NÃO parece-me improvável que o resultado seja muito diferente. Houve mais um milhão de eleitores que há nove anos, o que deu a vitória ao SIM. Os resultados oficiais neste momento apontam para os 54% para o SIM e 46% para o NÃO. Visto que estas são as freguesias mais pequenas, normalmente do Norte Interior, onde o NÃO tem mais defensores, tudo parece bem encaminhado... Ao menos isso. O dever cívico não prevaleceu, mas ao menos o sentido de voto dá uma mudança civilizacional importante.

Primeiros números

As primeiras indicações já sairam. 56 a 60% de abstenção, num referendo, numa matéria tão importante como esta. Seja qual for o resultado final começo a perceber o tipo de país em que vivo...

sexta-feira, fevereiro 09, 2007

Pursuit of Happyness

A caça aos Óscares continua, apesar de, dado o número de estreias, sentir que estou cada vez mais a perder terreno. O último filme que vi foi The Pursuit of Happyness, com Will Smith nomeado para o Óscar de Melhor Actor Principal.
O filme conta a história verídica de um homem que sem emprego, sem casa, dinheiro ou mulher e com um filho nos braços, consegue dar a volta e vencer na vida.
Não é um grande filme... na verdade é bastante mediano (o trailer é mais forte que a fita em si), passava bem por aqueles casos da vida da TVI, com valores de produção um pouco acima da média. Só há duas coisas que fazem com que se mereça uma ida ao cinema, Will Smith, que dá mostras de classe como actor dramático e o seu filho que se estreia como actor. Will Smith já não é surpresa, com Ali mostrou ter talento, apesar de aqui ter um desafio menos condizente com a sua persona pública e com o seu físico, interpretar um homem de meia idade caído em desgraça. Quanto ao seu filho Jaden Smith, costuma-se dizer que filho de peixe sabe nadar e com dois pais actores está bem encaminhado. O miúdo é uma delicia. Pouco mais há a destacar, da história já se conhece o fim antes de começar e o tempo passa sem sobressaltos de maior - salvo os azares consecutivos de que é vítima o nosso heroi - e acaba feliz. Típico filme de domingo à tarde se se quiser apenas passar o tempo.

quinta-feira, fevereiro 08, 2007


Foi no Domingo à tarde sem aviso, tinha discutido com a namorada e saiu. Numa curva, num repente, sem alcóol no sangue, sem sequer segurar nas suas mãos o volante, foi ceifado por uma mota que literalmente rasgou o carro onde seguia em dois. Tinha 22 anos e o último olhar que deitou à namorada foi de raiva.
Era do meu grupo de teatro, mal dei por ele enquanto vivia, um bom dia, um aperto de mão, um abraço, pouco mais. Um colega dizia que se lembrava da última coisa que lhe tinha ouvido, nada que merecesse ser recordado, qualquer trivialidade sobre cabelo. Mas foi a última coisa que lhe ficou na memória. A mim nada. Nem uma frase me lembro, nem o tom de voz, nada, quanto muito o sorriso e os traços do rosto que rapidamente apagaria.
Ontem estava lá, deitado num caixote de madeira, rodeado de familia e amigos. A mãe e a namorada não paravam de lhe tocar, de lhe dar festas, de o beijar no rosto. Os olhos não fechavam completamente, e um risco de branco deixava-se adivinhar. Apeteceu-me dizer-lhe que parasse, que se levantasse e fosse para a aula, que fizesse as pazes com a rapariga que esvaia a alma em lágrimas. Mas ele, teimosamente não se mexeu.
Hoje é o funeral e a cremação.
Tudo o que foi e tudo o que poderia ter sido vai ser reduzido a uma urna de cinzas. Quanto aos pais e amigos fica apenas o vazio, e à namorada a memória torturante das últimas palavras, das acusações mútuas, o ruído de um bater de porta.

Quanto a mim... nada... a ténue memória de quem passou por mim e eu nem vi.

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

Às quartas... porque sim!


Chega hoje ao fim a minha rubrica às quartas...porque sim!, onde explico porque é que vou votar SIM no referendo do próximo dia 11. Falei dos motivos de saúde pública, legais, mas creio a base de tudo se resume a um ponto. Vida.
Mas antes de mais vamos definir Vida: estado de actividade de animais e plantas; existência; espaço de tempo decorrido entre o nascimento e a morte; modo de viver; profissão; emprego; conjunto de coisas necessárias à subsistência; biografia; movimento; calor; animação; expressão animada; subsistência; sustentáculo; origem.
Nem esta definição, por mais extensa que seja, consegue chegar a um consenso, se é verdade que o embrião, o feto, existe, está em estado de actividade, também é verdade que não está no espaço de tempo entre o nascimento e a morte. Se calhar precisamos de mais uma ou outra definição. Homem: animal mamífero, bípede, bímano, racional e sociável que, pela sua inteligência e pelo dom da palavra, entre outros aspectos, se distingue dos outros seres organizados; pessoa adulta do sexo masculino; varão. Pessoa: ser ou criatura da espécie humana; ser moral ou jurídico; personagem; individualidade.
Assim pelo menos já sabemos do que estamos a falar. Acho que se pode dizer sem erro que a Vida, no sentido mais lato que existe, é algo que aparece no momento da concepção, é criado um código genético único e as células começam um processo de desenvolvimento e reprodução que irá culminar, se tudo correr bem, num ser humano, numa pessoa. A grande questão aqui é, pode um embrião ser equiparado a uma pessoa, a um ser humano, nascido, vivo? Não de um ponto de vista pessoal (como muitas vezes os partidários do Não advogam, que uma mãe já sente o seu filho como uma pessoa antes de ele nascer) mas sim do ponto de vista legal, ou seja de uma perspectiva geral. A minha resposta é não, um embrião e uma pessoa não são equivalentes. Um embrião não é um ser racional e sociável, não tem inteligência nem dom da palavra, não é um ser moral nem jurídico. Um embrião é algo que vai gerar uma pessoa e não uma pessoa em si.
Vou fazer uma comparação que pode chocar alguns, mas que creio ajuda a tirar o lado mais emocional da questão, mais pessoal. Um fruto, uma maçã por exemplo, tem em si tudo o que é preciso para gerar uma macieira. No entanto ninguém confunde comer uma maçã, colher uma maçã com abater uma árvore. Para a maçã gerar uma macieira precisa de estar na terra, de ter nutrientes e diversas condições climatéricas que lhe proporcionem o desenvolvimento. Para um embrião gerar um ser humano precisa de estar no útero materno, que lhe dêem nutrientes e diversas condições para singrar.
Não quero desta forma dizer que a vida intra-uterina não vale nada, ou não precisa de protecção, estou a afirmar que é diferente impedir o desenvolvimento de um embrião ou matar uma criança nascida, viva. Mas isto não é novo. A Lei actual defende o mesmo. Daí a pena máxima de prisão para uma mulher que aborte ser de 3 anos e a pena máxima para um homicídio ser de 25 anos de prisão. Daí a Lei permitir o aborto em caso de violação e não permitir a morte de um filho de um violador. Abortar não é matar crianças.

Há quem discorde, há quem acredite que é exactamente a mesma coisa afogar um bebé recém nascido ou fazer um aborto. Se for esse o caso, a única hipótese é votar Não, e lutar com toda a sua força para que a actual lei seja alterada, para que o aborto não seja possível em nenhum caso, ou que o risco de vida para a mãe seja a única circunstância em que o aborto seja possível.

Ou então pode-se achar que a vida intra-uterina algo a proteger, mas não é o valor mais alto de uma sociedade, que existem circunstâncias, várias circunstâncias, que fazem com que a vida, a saúde física, psíquica, familiar, emocional da mãe se sobreponham a um embrião. Que existem males que não temos condições de avaliar se os não vivermos, e que as pessoas que tomam essa difícil decisão devem ser protegidas e não perseguidas, devem ser apoiadas no seu percurso.

No próximo Domingo, pelos motivos que enunciei e por todos os motivos íntimos, privados de todas as mulheres, de todas as famílias que se vêm forçadas a tomar esta decisão, voto SIM.

terça-feira, fevereiro 06, 2007

A pólvora!


Senhoras e senhores, meninos e meninas, aproximem-se, venham descobrir a mais fabulosa invenção do século: a pólvora! Sim meninas e meninos foi inventada a pólvora, mas a pólvora seca, faz o mesmo barulho que a outra, tem o mesmo aspecto que a outra, mas não tem efeito nenhum. Seja como for, entretém e ilude a multidão. Tenho o prazer de vos apresentar: o crime sem castigo! SIM! ou melhor NÃO! O crime sem castigo é a grande invenção Não. Ora bem, a grande ideia agora é votar NÃO no referendo que depois os partidários do NÃO prometem fazer passar uma lei onde a mulher não é julgada. Mas o aborto é crime? Sim! Posso fazer? Pode! E o que me acontece? Nada! (Isto faz-me lembrar um programa de comédia... o que será?)
O Não já não consegue defender a penalização das mulheres, sabe que toda a gente acha isto um absurdo, à excepção daqueles que são também contra a lei actual, e que pelo menos são coerentes. Então agora inventam o NIM! Vota Não que parece Sim! Ou seja, fica tudo na mesma, mas a lei muda para que as mulheres não sejam julgadas, é a suspensão provisória do processo.
Banha da cobra!
Qual é o problema desta nova invenção, tão badalada no Prós e Contras de ontem? Em primeiro lugar mantém o estatuto de crime, a mulher continua a ser considerada uma criminosa e tem que cumprir certas regras, certas sanções. Ora como mulheres na cadeia já não existem não percebo a diferença para o estado actual. Em segundo lugar todos os outros intrevenientes (médicos, parteiras, enfermeiros, etc) são criminosos e julgados como tal, ou seja, nada de aborto em hospitais e clínicas, vamos é manter o aborto clanestino, vamos manter as mulheres em fuga, a recorrer a sítios onde se pagam balúrdios e com condições duvidosas, vamos manter esta vergonha nacional, mas fazendo de conta que se muda, fazendo de conta que se não persegue a mulher, como se a prisão fosse a única coisa que está mal neste momento! E ainda por cima é uma proposta que nem sequer pode ser posta em práctica, como o Dr. Rui Pereira (jurista) explicou: não é possivel haver uma suspensão provisória do processo obrigatória! Se há crime, tem que haver castigo, pode em certas circunstãncias ser suspenso mas não existe tal coisa na lei como suspensão obrigatória!
É antes de mais cobarde! É querer enganar as pessoas que são a favor da despenalização (e não a favor do aborto, é bem diferente!) dizendo-lhes que o Não é afinal... SIM!

Ontem o Prós e Contras era motivo para rir! O Filipe Anacoreta Correia que diz que o referendo não é uma questão moral! Ai não??? Então o que são questões morais??? Vamos lá ao dicionário - Moral: conjunto de costumes e opiniões que um indivíduo ou um grupo de indivíduos possuem relativamente ao comportamento; conjunto de regras de comportamento consideradas como universalmente válidas; parte da filosofia que trata dos costumes e dos deveres do homem para com o seu semelhante e para consigo; ética; teoria ou tratado sobre o bem e o mal.
Toda a Lei é moral! É a definição de certo e errado de bem e de mal, não existe questão mais moral que esta!

Ou o argumento do Dr Manuel Antunes que afirma "Nós não sabemos o amanhã!" - como motivo para não mudar a lei. Ora o desconhecimento do futuro serve para não mudar NADA!

Ou o escândalo quando se disse que a protecção da vida intra-uterina não se faz pelo direito penal, que existem outras formas que não penais, que não criminais!

Enfim... à meia noite resolvi ir dormir. Há posições de tal maneira contraditórias e ilógicas que mais vale ir para a cama...

É triste ver que o Gato Fedorento passou da comédia para um argumento defendido na realidade por uma das partes...

Rufus Wainwright

É o meu novo sabor musical do momento, este americano-canadiano com a sua voz inconfundivel, chamou-me a atenção com o misto de pop, musical e rock independente. Esta canção, Cigarettes ans Chocolate Milk é do seu segundo album Poses, e não me sai da cabeça. Não sei porquê mas visualizo-a como o início perfeito para a versão cinematográfica de Frozen...

Bem... seja como for... é a música da semana.

segunda-feira, fevereiro 05, 2007


Eu sei que não é quarta mas não podia deixar de partilhar este texto. Vale a pena lêr para perceber que se calhar nem todos na Igreja têm o pensamento fechado e retrógrado que lhe é atríbuido.

texto retirado daqui.

Amador

Amador é a nova peça dos Artistas Unidos, que estreou dia 1 de Fevereiro no Convento das Mónicas. Um crítico de teatro chega a casa vindo de mais uma peça. Está farto, jura para nunca mais ir ao teatro, diz que o drama existe em todo o lado menos no palco, está furioso, ao mesmo tempo o drama que se desenrola em sua casa é-lhe invisivel.
Amador é uma peça com uma ideia, o problema é que não tem mais do que isso: uma ideia. O crítico entra em casa e repete o mesmo texto ao longo de toda a peça, está farto, diz que está farto, que basta ligar a televisão ou lêr o jornal para se ver o drama da vida real e que no palco só existe vazio, a Arte como uma manifestação pseudo-intelectual das frustrações dos artistas, enormes egos vazios. Mas não sai dali... repete inclusivé linhas inteiras de texto três, quatro, cinco vezes, Gerardjan Rijnders (o autor da peça) não sabe o que fazer com este personagem, então transforma-o num disco riscado. Mas nem sequer o que diz é sobejamente interessante, não faz sequer uma crítica com pés e cabeça ao teatro, repete frases ocas que se esgotam nos primeiros cinco minutos. À sua volta o drama da vida real desenrola-se e ele é cego, surdo e mudo. Não vê a sua mulher bêbeda, o seu filho toxicodependente que se masturba em frente a ele, que destroi a casa, que viola e mata a própria mãe.
A peça acaba como começa, o crítico está farto, diz que o drama está em toda a parte e não vê o drama ao seu lado. Mas isso já se tinha percebido há uma hora atrás. Os actores fazem o que podem, mas não têm muito que fazer, os personagens são estáticos, não evoluem, não têm acção, não mudam emocionalmente. Como diz o Amador: no palco... nada.


Amador
Artistas Unidos

De: Gerardjan Rijnders
Tradução: Lut Caenen
Interpretação: António Filipe, Elsa Galvão, Sérgio Conceição
Cenário e Figurinos: Rita Lopes Alves

De 1 de Fevereiro a 3 de Março de 2007
Quarta, Quinta e Sexta - 21h30, Sábado - 18h30 e 21h30


Artistas Unidos
Convento das Mónicas
Travessa das Mónicas
Telefone: 961 960 281/707 234 234
www.artistasunidos.pt
info@artistasunidos.com

sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Blood Diamond

Chega a época dos Óscares e o número de estreias de filmes que merecem a pena triplica. Entre a semana passada e esta semana estrearam meia dúzia de longas-metragens e a corrida contra o tempo começou. Ontem foi a vez de Blood Diamond, último filme de Edward Zwick (Glory, The Last Samurai), nomeado para 5 Óscares, dos quais se destacam as nomeações para Leonardo DiCaprio e Djimon Hounsou, os dois actores à volta dos quais todo o filme revolve.

Em 1999 na Sierra Leoa, as guerrilhas revolucionárias espalham o terror, numa guerra contra o governo, patrocinadas pelos diamantes que conseguem através de trabalhoi escravo em minas ilegais. DiCaprio é Danny Archer, um traficante de diamantes que perdeu o seu último carregamento, Djimon Hounsou é um homem que perdeu a sua família e foi forçado a trabalhar numa mina de diamantes. Um diamante de cem quilates que este encontrou é o motivo da cobiça de muita gente, entre os quais de DiCaprio que, para o obter, lhe promete ajudar a reencontrar a família.

Blood Diamond é um filme interessante, aborda temáticas conhecidas mas quase sempre ignoradas, dos dramas violentos que ocorrem em África. Mas é antes de mais uma história de personagens, uma história humana de procura, perda e até de redenção. Se Zwick não é nenhum génio, é pelo menos um realizador capaz de contar uma história, sabendo guiá-la e perceber os seus altos e baixos, conduzindo-nos através de uma viagem com tom épico, momentos ternos, tensos e com o seu toque de acção. A fotografia é lindissima e a cargo do nosso Eduardo Serra.

Não sendo inovador é no entanto merecedor de uma visita muito atenta.

quinta-feira, fevereiro 01, 2007

Pena...

Na última quarta feira o último exercício da aula de teatro foi fixar o olhar num colega e, ao som de música, colocá-lo num espaço, para depois o transformar num personagem e imaginar uma história. Ficámos de a escrever para ontem trabalharmos sobre ela. Segunda-feira não pude ir à aula (caso raro) e portanto ontem fui com ânimo redobrado. O Bruno atrasou-se e pediu a uma colega para começar o relaxamento inical. Passado meia hora já estavamos todos mais que relaxados e ele sem aparecer. A Patricia (a tal colega) tentou que começássemos um exercício sensorial baseado na história, enquanto esperávamos. Alguns fizemos, outros não, mas sem perturbar. Às 20h30 soubemos que o Bruno não vinha... o resto do tempo passou entre conversas, despedidas e pouco mais. Afinal de contas não houve aula... Para mim faz a semana inteira... É incrivel como fico com comichões quando isto acontece, a falta que me faz este trabalho é impressionante. Bem, segunda começa-se de novo. Fica só a referência para a Patricia, que sem preparação, nem aviso, conseguiu durante quase hora e meia manter a turma a funcionar, a fazer qualquer coisa de minimamente util e sem se dispersar. Não é fácil, principalmente para uma aluna, obrigado pelo esforço.