Evolução ou extinção?
Há uma semana fui confrontado com o facto de o Papa ter reunido um conselho para debater a questão do celibato dos padres. Foi-mo dito por uma católica, que via aqui uma possível abertura, uma racha nas posições mais retrógradas instituídas no seio do Vaticano.
Na sexta feira passada li, quase em nota de rodapé no Diário de Notícias, que “O Papa Bento XVI e a Cúria Romana reafirmaram ontem (quinta feira) os valores do celibato para os padres” e que “Rejeitando categoricamente qualquer possibilidade de ordenação ou readmissão de padres casados, o Vaticano acabou por minimizar o alcance do encontro classificando-o como uma “reunião periódica destinada a uma reflexão comum””.
Ou seja nada. Foi apenas um fait-divers.
Mas na mesma semana outras notícias vieram a lume. D. Jorge Ortiga, arcebispo de Braga e presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) não só se voltou a pronunciar (naturalmente) contra a despenalização do aborto, pedindo aos fieis para saírem à rua em prol do “Não” no referendo, como nem sequer reconhece à Assembleia da República o direito de legislar sobre o assunto. Diz que “o Estado não pode declarar boa uma coisa que é má.” Acha portanto que existe o Bem e o Mal absoluto, sem perspectiva histórica, moral ou social e que o Povo não tem capacidade de o reconhecer, mas sim a visão iluminada da Igreja. A Assembleia, eleita pelos cidadãos, não tem capacidade de decidir o que é certo ou errado, mesmo depois de referendado, ou seja as pessoas que votaram nas legislativas e que vão votar no referendo são seres cuja opinião do mundo e valores morais não interessa, se esses valores forem contra a opinião de D. Jorge Ortiga.
Felizmente longe vão os tempos em que a Verdade era uma noção absoluta postulada pela Santa Sé, felizmente longe vão os tempos da Inquisição e da caça às bruxas – onde aliás o respeito pela vida não era a primeira prioridade – e hoje se pode votar e decidir sem se estar sob o jugo de bispos, arcebispos e cardeais.
Mas a Conferência Episcopal não se ficou por aqui, considerou que a procriação medicamente assistida (nomeadamente no que toca à utilização de óvulos ou espermatozóides externos ao casal) é “uma infidelidade, ainda que consentida” e que “não está conforme com as exigências morais do Cristianismo e mesmo da ética natural”.
Esta é capaz de ser a visão mais retrógrada que já conheci. Segundo a CEP a fidelidade já não envolve mentira, engano, relações afectivas ou emocionais com terceiros, nem sequer um envolvimento físico com alguém externo ao casal, mas basta a existência de uma célula externa ao corpo de cada um. Que dirão da doação de órgãos? Que dirão de alguém que fica com o coração ou o fígado de outrem? Ou será que é infedilidade por gerar uma criança? Será a visão medieval de infedilidade o facto da mulher carregar no seu útero um filho que parte da célula de outro homem que não o marido? Como é possível no século XXI que se defendam noções tão arcaicas de Bem e de Mal, de Amor e de Fidelidade?
Padres casados? Seria bom. Talvez ganhassem uma maior noção do que carga de água estão a falar, em vez de puxarem de noções e chavões mais mortos que o Latim, e que serviram de base para as maiores barbaridades da História.
Ao que parece a evolução não existe.
4 comentários:
começa a haver uma evolução... com estes disparates todos, o que a igreja católica está a provocar é um cada vez maior afastamento dos fiéis, que se viram para outras igrejas mais "liberais" e menos idiotas... mais ligados à vida terrena do nosso século, ajustados (por conveniência ou não) à natural evolução das coisas, das pessoas e das relações.
para o bem ou para o mal, não é por acaso que assistimos à proliferação de Manás, Igrejas Universais do Reino de Deus e outras que tais...
Como em qualquer mercado, a concorrência também existe na Igreja, e as regras acabam por ser semelhantes... apesar de o objectivo final não ser o lucro (teoricamente) mas sim um número cada vez maior de fiéis. A Igreja, líder de mercado, mantém os valores que a levaram a ascender a esse mesmo patamar. Os concorrentes, obviamente, aproveitam tudo o que podem aproveitar para aumentarem a sua quota de mercado. Estão, portanto,com carta branca e não têm nada a perder. As contas são fáceis - se a Igreja procedesse às actualizações que se lhe pedem poderia roubar alguns fiéis aos concorrentes mais peqenos, mas provavelmente perderia uma quota ainda maior, pois grande parte dos fiéis são do tempo das ideias menos "liberais" e mais idiotas. Certo?
É como se o Benfica de repente requisitasse que todos os seus adeptos teriam que ter uma formação académica... quantos dos tais 6 milhões cumprem os requisitos? Que vantagens teria a instituição?
Mercado? John... diz-me que não li o que acabei de lêr! Estás a comparar a defesa da Igreja de valores fundamentais com a busca do lucro? Com um balanço de quantos fieis ganho versus quantos fieis perco? Mas então a Igreja está à venda? Afinal isto tem a vêr com adeptos? Com contas? Com ser primeiro? Tipo guerra de supermercados, eu desco os preços se tu desceres?
Então e se de repente toda a gente aprovasse o canibalismo? A Igreja passaria a dizer que era correcto só para não perder fieis?
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