Conversa alta e animada no metro, alguem vociferava algo a ver com Castelo Branco e Bragança. Levanto-me. Ele, alto, muito magro, calças azuis a estrear, camisa vermelha, virava sem parar as páginas do "Metro". Olhando a porta, de costas para toda a gente, gritava sozinho: "Nem antigamente, quando isto era pior. Agora nem as capitais de distrito, nem Bragança, ou Castelo Branco!". Quando as portas se abriram começou a correr como se perseguisse o seu destino.
A rotunda do Saldanha à hora do almoço não se afigura como o sitio mais apetecivel para passear de carro. Atrasado para uma refeição que o meu estômago há muito pedia, irritado pelo trânsito excessivo que a greve do metro origina, fazia a curva em direcção ao sinal vermelho. Parado, perto da berma, mas ainda na estrada, estava um espectro, curvado, fato completo castanho muito usado, saco de plástico numa mão e bengala na outra, que não se apoiava no chão. Parecia o João César Monteiro, que, em vez de morrer, se tinha escondido no meio dos indigentes da sua cidade. Barba rala, olhava atentamente o vazio...
A primeira vez que o vi estava sentado numa cadeira de plástico, a meio da tarde, no pequeno espaço entre carros estacionados. Dias mais tarde, numa noite de Junho, situava a mesma cadeira na ombreira da porta de um restaurante da mesma rua. Mas ontem pouco depois do Arco Escuro na Rua dos Bacalhoeiros, esta velha figura adormecida, com a idade bem avançada, via escorrer languidamente os dias rodeado das bases de um andaime que ali está a ser colocado. Parecia uma triste escultura em exposição...
2 comentários:
são os loucos de Lisboa...
Tu mereces o céu!
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